Domingo III da Páscoa – ano C – 2022

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Domingo III da Páscoa – ano C – 2022

1 – Levantai-vos! Vamos!

É o lema do ano pastoral na nossa mui e nobre diocese de Lamego. É o desafio de Jesus aos Seus discípulos. Na hora da desolação, Jesus incentiva os apóstolos. No Jardim das Oliveiras, depois da oração intensa, do adormecimento dos Seus discípulos, quando se aproxima a prisão, o julgamento, a condenação e a morte, Jesus predispõe-se, em tudo, a cumprir a vontade do Pai, a viver apenas para amar e servir, e chama os seus amigos para que O acompanhem naquela hora tenebrosa. Hoje, chama-nos a nós, não apenas nas folgas mas em todos os momentos, também nos dolorosos.

Ao terceiro dia, depois da crucifixão e morte, Jesus ressuscita e aparece aos Seus discípulos. O tempo de seminário acabou, é tempo de partir, de ir por todo o mundo e anunciar o Evangelho a toda a criatura. Ele está connosco até ao fim dos tempos, se aceitarmos espalhar a alegria, a paz e o amor que Ele nos dá.

O Evangelho expressa bem a certeza da Sua presença. Ele age em nós, inundando-nos com o Seu amor e a Sua luz, com o Seu Espírito, e através de nós se aceitarmos ser instrumentos da Sua misericórdia, reconhecendo-O nos irmãos.

Simão Pedro, Tomé, Natanael, os filhos de Zebedeu (Tiago e João) e mais dois discípulos encontram-se junto do mar de Tiberíades e decidem fazer aquilo que faziam antes de conhecerem Jesus e de O seguirem, vão pescar. Pescadores experientes, conhecem os tempos mais favoráveis à pesca, mas a noite não rendeu nada. Ao romper da manhã, Jesus surpreende-os, questionando-os: «Rapazes, tendes alguma coisa de comer?». Como a resposta fosse negativa, Jesus desafia-os: «Lançai a rede para a direita do barco e encontrareis». Eles fizeram como lhes disse e pescaram em abundância.

Quando chegam à margem, já Jesus tem o lume aceso, com alguns peixes e pão e logo lhes pede: «Trazei alguns dos peixes que apanhastes agora».

Sem Jesus, o tudo é nada. Com Jesus, até do nada surge a abundância. Ele age. Ele toma a iniciativa, mas conta com a nossa resposta, com a nossa cooperação, com os nossos peixes, com o nosso empenho. O pão que Ele nos dá é fruto dos dons que nos concede e do trabalho que realizamos.

2 – O discípulo predileto percebe Quem é e di-lo a Pedro: «É o Senhor». Sobrevém, novamente, a espontaneidade de Pedro que logo veste a túnica, se lança ao mar e vai ter com Jesus. Os outros discípulos encarregam-se de puxar as redes para o barco. Quando chegam à margem, Pedro sobe ao barco e puxa as redes para a terra, com 153 grandes peixes, sem que a rede se rompa.

Ao longo do tempo, a Igreja é comparada a uma barca, a nova Arca da Aliança. Como analogia, também as redes, que não se rompem. O mandato de Cristo é óbvio, de noite ou de dia, lancemos as redes para a pesca. A abundância não depende de nós, mas d’Ele, mas cabe-nos lançar as redes. Não há peixes a mais. Todos são necessários. A rede não se rompe. A barca alberga todos os que nela quiserem entrar. Quando pensarmos que tudo depende de nós, dos nossos talentos, do nosso trabalho, do nosso esforço, acabaremos por nos perder, sem pescar nada, sem encontrar o rumo certo, navegaremos à deriva, apesar dos nossos conhecimentos e experiência. Quando O seguimos, a pesca será abundante, ainda que haja momentos em que o Sol não brilhe e que o mar esteja revolto. Confiemos! Ele não nos falta. Façamos, simplesmente, o que está ao nosso alcance, por amor, em atitude de obediência.

Parafraseando santo Inácio de Loyola, rezemos como se tudo dependesse de Deus, trabalhemos como se tudo dependesse de nós. Unem-se, desta forma, duas vontades, a de Deus, a Quem rezamos, e a nossa vontade para pôr em marcha os Seus desígnios de amor. Se a oração envolver a nossa dedicação, se a vontade de Deus prevalecer na nossa vontade, corremos menos riscos de instrumentalizar os outros e de nos auto endeusarmos.

3 – Deus criou-nos livres, mas em comunidade. Somos responsáveis uns pelos outros e por todos. Caim olhou com inveja para o seu irmão e viu-o como adversário e inimigo, e matou-o.

Com a prisão, julgamento e condenação do Mestre, Pedro, como os demais apóstolos, soçobrou ao medo. Sentiu-se só, abandonado. Aquele Jesus, que lhe tinha dado esperança, vai acabar como tantos outros. O medo venceu a confiança e a amizade, destruiu promessas e sonhos. Pedro jurou que defenderia o Mestre até às últimas consequências. Ainda pegou na espada e feriu um dos guardas que prendeu Jesus! Todavia o medo prevaleceu. Os discípulos fogem, deixam de ser grupo, de ser comunidade, mantêm-se à distância. Quando alguém interpela Pedro sobre a sua proximidade com Jesus de Nazaré, ele nega resolutamente dar-se com Ele.

Agora é tempo de rever as opções e arrepiar caminho. Jesus confia em Pedro, mas Pedro precisa de tomar consciência que a espontaneidade não é suficiente. A vocação não é um capricho, um desejo momentâneo. Deus chama-nos e leva-nos a sério. É com seriedade que temos de Lhe responder. Não apenas nos dias bons, não apenas quando estamos alegres, mas em todas as horas, também naquelas em que advém a dúvida, a treva e a hesitação.

Pedro negou conhecer Jesus por três vezes. Jesus pergunta a Pedro por três vezes: «Simão, filho de João, tu amas-Me mais do que estes?». Não basta dizer da boca para fora. Pedro compreende que, por vezes, não é fácil a fidelidade no tempo. «Senhor, Tu sabes tudo, bem sabes que Te amo». À terceira vez, sobressai a tristeza de Pedro, mas também a humildade. O caminho preparado para Jesus lhe confiar a Igreja: «Apascenta as minhas ovelhas. Em verdade, em verdade te digo: Quando eras mais novo, tu mesmo te cingias e andavas por onde querias; mas quando fores mais velho, estenderás a mão e outro te cingirá e te levará para onde não queres».

4 – Uma fé ressuscitada, amadurecida, fundada no encontro com Jesus, vivo entre nós, alimentada pela oração e pela gratidão, facilita o encaixe de todas as peças da nossa vida. Há acontecimentos que nos são exteriores e não dependem de nós, mas a forma como os vemos pode fazer toda a diferença entre o lamento constante, que nos deprime, e a relativização dos mesmos, que nos faz aceitar o que não pode ser mudado. Quando o sofrimento é enorme, a fé ajuda a dividir e a partilhar, a aliviar a carga, colocando o coração em Deus, para que Ele cuide com amor e nos proteja. Cada um sofre à sua maneira, mas sofrer ensimesmado, fechado, torna tudo mais obscuro e mais frustrante. Ter alguém que nos acompanha, nos escuta, nos ampara, faz-nos acreditar que mais à frente encontraremos a paz, o sentido, a vida nova, e, agora, já nos sentimos “aquecidos” pela presença.

As últimas horas da vida de Jesus Cristo criaram nos apóstolos uma sobrecarga de adrenalina, medo, ansiedade. Depois da ressurreição, e do encontro com o Ressuscitado, a confiança acolhe o medo e transforma-o em resiliência, a fé gera coragem, porque já não é possível destruir a vida, pois Deus, em Cristo, nos ressuscitará. Pedro nem parece o mesmo. À espontaneidade une a alegria, o anúncio convicto, enfrentando a ameaça, a prisão, os açoites e o risco de ser morto. A resposta de Pedro é clarificadora: «Deve obedecer-se antes a Deus que aos homens. O Deus dos nossos pais ressuscitou Jesus, a quem vós destes a morte, suspendendo-O no madeiro. Deus exaltou-O pelo seu poder, como Chefe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e o perdão dos pecados. E nós somos testemunhas destes factos, nós e o Espírito Santo que Deus tem concedido àqueles que Lhe obedecem».

Açoitados e intimados a silenciarem o nome de Jesus, eles saem do tribunal judaico cheios de alegria por terem tido a oportunidade de dar testemunho.

5 – O livro do Apocalipse, de São João, coloca em paralelo as perseguições à Igreja e a confiança firme que Deus não abandona os que Lhe são fiéis. As visões do apóstolo mostram como as guerras, as perseguições, as trevas são passageiras, magoam, mas não eliminam a esperança, não sepultam a vida, pois essa é assegurada pela omnipotência do amor de Deus.

O sangue de Cristo, expressão da Sua vida oferecida por nós, salva-nos da perdição e insere-nos na vida divina. Os Anjos entoam: «Digno é o Cordeiro que foi imolado de receber o poder e a riqueza, a sabedoria e a força, a honra, a glória e o louvor». E com os Anjos, todas as criaturas do céu e da terra, exclamam: «Àquele que está sentado no trono e ao Cordeiro o louvor e a honra, a glória e o poder pelos séculos dos séculos». Pelo louvor e adoração deixamos que Deus nos preencha com a Sua ternura.

6 – Este Domingo, o primeiro do mês de maio, é o Dia da Mãe. Rezemos por elas, por todas as mães que o souberam ser na bonança e nas lágrimas, pelas que perderam os filhos, pelas que receberam ingratidão, apesar de todos os esforços feitos em prol dos filhos, pelas mães que continuam a irradiar vida e ternura, mesmo que destroçadas.

Que a Virgem santa Maria inspire todas as mães e n’Ela possam encontrar o ânimo para lidar com as dores que as atormentam, como Ela junto à Cruz.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano C): Atos 5, 27b-32. 40b-41; Sl 29 (30); Ap 5, 11-14; Jo 21, 1-19.