Domingo XXI do Tempo Comum – C – 2022

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Domingo XXI do Tempo Comum – C – 2022

1 – Chama-se a atenção de um adolescente, no contexto de uma sala de aulas, por exemplo, e é provável que responda que os outros também estão a falar! Ou, numa família, os pais chamam a atenção de um dos filhos que lhes dirá que o irmão ou a irmã também fizeram o mesmo! Nos dias que correm, também nos adultos existe a tendência crescente de fazer como os outros fazem, no bem e no mal! Se os outros fazem e se safam, porque não hei de fazer também? Somos iguais! Se eles têm direito, eu também tenho! Se eles fazem o que querem e ninguém os chama a atenção porque não hei de fazer também! Anda meio mundo a enganar outro meio, porque não hei de estar do lado do meio nundo que tira vantagens do outro meio mundo?

Jesus percorre cidades e aldeias a ensinar. No caminho, alguém Lhe pergunta: «Senhor, são poucos os que se salvam?».

Todos, enquanto pessoas, somos curiosos. Uns mais que outros! Uns por umas razões e outros por outras. A curiosidade é saudável na medida em que nos desperta para a aprendizagem, para o conhecimento dos outros e do mundo em que vivemos. É doentia, porém, quando é por mera coscuvilhice ou se conduz à maledicência, à inveja e ao ciúme.

Não sabemos exatamente a intenção de quem interroga Jesus, mas a resposta recentra-nos no que nós podemos e devemos fazer, responsabiliza-nos no caminho da salvação. «Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque Eu vos digo que muitos tentarão entrar sem o conseguir».

2 – Preocupar-nos com a salvação dos outros é meritório! Por certo! Cabe-nos criar as condições para que também os outros se sintam impelidos a aderir ao projeto cristão, não para engrossar fileiras, mas porque é um projeto que faz bem, salva, humaniza, cria fraternidade, liga-nos aos outros, compromete na transformação do mundo, possibilitando que este seja casa. A fé permite-nos esperar na ressurreição, numa vida que não acaba, ou melhor, que acaba neste mundo, na história, mas que é ressuscitável em Deus, na comunhão eterna. A boa nova de Jesus Cristo, que nos assume como irmãos, garante-nos uma vida abundante, não no horizonte de alguns anos, mas neste horizonte aberto à eternidade! Se é uma boa notícia, só temos que a divulgar, espalhar, partilhar para que mais pessoas saibam do amor de Deus por nós e vislumbrem o caminho que salva!

Na verdade, não faz sentido festejar sozinho! Podemos rir-nos de nós mesmos! Podemos saltar, gritar, dançar, cantar sozinhos! Mas, em definitivo, a festa exige companhia, partilha, comunhão! É mais fácil carpir sozinho as feridas do que celebrar a vida e os acontecimentos felizes.

Para Deus, cada pessoa vale! Vale muito? Não, vale tudo. Cada um de nós. Tu e eu! Se valemos tudo para Deus, se cada um vale tudo para Deus, então cabe-nos corresponder à Sua vontade e fazer com que o nosso semelhante se sinta verdadeiramente em casa, se sinta verdadeiramente filho amado de Deus. Não se trata de números, de estatística, de quantidade, trata-se de dar o melhor de nós mesmos a favor de cada pessoa que encontramos. Quando ajudamos uma pessoa, uma única pessoa que seja, estamos a ajudar todas as pessoas, pois será menos uma que precisa de ajuda e que pode ajudar outras.

3 – A universalidade da salvação corresponde aos desígnios divinos. Ao longo do Evangelho, Jesus desperta o coração e a mente dos seus discípulos para acolherem samaritanos, estrangeiros, publicanos e pecadores, mulheres e crianças, doentes e maltrapilhos. Ele, Jesus, Filho de Deus, veio para os que andavam perdidos. A opção preferencial é pelos mais pobres e desprotegidos. São os doentes que precisam de médico, são os pecadores que precisam de Deus e da salvação. Não há excluídos. Todos são chamados. A salvação destina-se a todos.

Assim é no Evangelho, mas também nas Escrituras sagradas do Antigo Testamento. O profeta expressa a vontade de Deus: «Eu virei reunir todas as nações e todas as línguas, para que venham contemplar a minha glória… De todas as nações, como oferenda ao Senhor, eles hão de reconduzir todos os vossos irmãos, até ao meu santo monte, em Jerusalém, como os filhos de Israel trazem a sua oblação em vaso puro ao templo do Senhor».

Por vezes resistimos, sobretudo quando nos cabe comunicar a boa nova aquelas pessoas que nos incomodam ou perante as quais não nos sentimos confortáveis. Ainda assim, devemos usar de hospitalidade, de ternura e de compaixão por todos, pois todos são de Deus e só dessa forma nos colocamos dentro da sua Vida.

Peçamos-Lhe que venha em nosso auxílio: «Senhor nosso Deus, que unis os corações dos fiéis num único desejo, fazei que o vosso povo ame o que mandais e espere o que prometeis, para que, no meio da instabilidade deste mundo, fixemos os nossos corações onde se encontram as verdadeiras alegrias».

Amar os que Deus ama e servi-los, cuidando deles! A horizontalidade do serviço é fortalecido pela verticalidade do olhar. Fixemo-nos no Senhor, para melhor vermos e servirmos os irmãos.

4 – O salmo desafia-nos à evangelização, com o refrão inspirado em São Marcos (16, 15): “Ide por todo o mundo, anunciai a boa nova”. Regressando ao Evangelho, este é o nosso compromisso de entrarmos pela porta estreita, isto é, o de fazermos o que está ao nosso alcance, para que cada pessoa que se cruza connosco possa saber como encontrar a Porta que é Cristo Jesus, experimentando também a alegria de se saber amada por Deus e de sentir que a vida se multiplicará na eternidade.

O anúncio passa também pelo louvor, reconhecendo a misericórdia e a bondade de Deus. “Louvai o Senhor, todas as nações, aclamai-O, todos os povos. / É firme a sua misericórdia para connosco, a fidelidade do Senhor permanece para sempre”.

5 – Deus é Pai e mais Mãe (João Paulo I). O santo Padre, o Papa Francisco, numa das suas catequeses de quarta-feira (19/01/2019), sobre a oração do Pai-nosso, aprofunda esta temática, tendo presente também a parábola do filho pródigo. Diz o papa, “O pai daquela parábola tem modos de agir que recordam muito o espírito de uma mãe. São sobretudo as mães que perdoam os filhos, que os defendem, que não interrompem a empatia em relação a eles, que continuam a amar, mesmo quando eles já não mereceriam mais nada”. Sintonia perfeita com o dizer do Papa João Paulo I. E prossegue, dizendo: “Deus procura-te, mesmo que tu não o procures. Deus ama-te, ainda que tu o tenhas esquecido. Deus vislumbra em ti uma beleza, não obstante tu penses que desperdiçaste inutilmente todos os teus talentos. Deus é não só um pai, mas é como uma mãe que nunca deixa de amar a sua criatura. Por outro lado, há uma ‘gestação’ que dura para sempre, muito além dos nove meses da gestação física; trata-se de uma gestação que gera um circuito infinito de amor”.

Exortação semelhante encontramos na Epístola aos Hebreus, a certeza que Deus, que é Pai, não cessa de se ocupar e preocupar connosco. A correção paterna, quando necessária, não é consequência de azedume, mas do amor. Habitualmente alertamos, com mais insistência aqueles que amamos. «Deus trata-vos como filhos. Qual é o filho a quem o pai não corrige? Nenhuma correção, quando se recebe, é considerada como motivo de alegria, mas de tristeza. Mais tarde, porém, dá àqueles que assim foram exercitados um fruto de paz e de justiça. Por isso, levantai as vossas mãos fatigadas e os vossos joelhos vacilantes e dirigi os vossos passos por caminhos direitos, para que o coxo não se extravie, mas antes seja curado».

A vontade de Deus, Pai com coração de Mãe, é que todos cheguem ao Seu reino, todos se deixem salvar pelo Seu amor, entrando pela porta estreita, que é Jesus, onde todos cabem!

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (C): Is 66, 18-21; Sl 116 (117); Hebr 12, 5-7. 11-13; Lc 13, 22-30.