Domingo XXXII do Tempo Comum – ano A – 2023

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Domingo XXXII do Tempo Comum – ano A – 2023

1 – O reino de Deus, em última análise, é o próprio Jesus Cristo. Fixou a Sua morada entre nós, viveu misturado connosco, deixando-Se confundir como simples mortal, sujeitando-se às leis que regem a nossa vida humana e a vida do mundo. Durante três anos, semeou a esperança, anunciou o reino de Deus, fez-Se próximo, mostrou como é possível viver segundo os valores do reino divino, revelou um Deus que é Pai que nos ama até ao limite, assumindo-Se como nosso irmão e assumindo-nos como irmãos. O reino de Deus, mais que um espaço, é um encontro, uma relação, um acontecimento, uma Pessoa. O reino de Deus é Jesus Cristo, com a Sua vida, mensagem e prodígios, e especialmente com a Sua morte e ressurreição, mistério pascal que, em definitivo, nos abre as portas da eternidade.

O reino de Deus é relação. Deus quer-Se tão próximo que Se faz um de nós, encarnando e tornando visível a possibilidade de nos relacionarmos como Ele, como Pessoa e nas pessoas que Ele criou por amor.

O reino de Deus é procura e caminho. Quem se dá por satisfeito perde-se! Quem acha que já tem garantido o Céu e se desliga dos outros, desliga-se também de Deus e acabará por se perder. Não percebeu que o reino de Deus também é compromisso de escuta, de busca e de se deixar encontrar por Deus. Como Deus, também o Seu reino, não se pode dizer que está aqui ou ali, o reino de Deus é o Seu amor por nós que nos preenche, ilumina e nos torna semeadores de esperança e de paz.

2 – As categorias humanas são insuficientes para compreendermos o que é invisível aos nossos olhos: Deus, a eternidade, o Céu, o reino de Deus. Jesus simplifica, mostrando-nos, n’Ele, o próprio Deus. Quem Me vê, vê o Pai. Eu e o Pai somos UM! Do mesmo modo, o reino de Deus não é um lugar, mas a pessoa de Jesus Cristo e a nossa relação com Ele. Através das parábolas, Jesus ajuda-nos a perceber como podemos acolher o reino de Deus e fazer parte dele.

Jesus compara o reino de Deus a dez virgens que, convidadas para o banquete nupcial, tomam as suas lâmpadas e vão ao encontro do esposo. Cinco delas, além das lâmpadas, levam almotolias com azeite. As outras cinco, levam apenas as lâmpadas. Porque não sabem (não sabemos) a hora, e como o esposo se demora, começam a dormitar e acabam por adormecer. As dez virgens estão na mesma situação, todas adormecem. A meio da noite, alguém anuncia a aproximação do esposo e logo as virgens se levantam e preparam as lâmpadas. As virgens “insensatas”, não tendo reserva de azeite, pedem às prudentes que dividam do seu. Mas elas logo atalham, dizendo: “Talvez não chegue para nós e para vós. Ide antes comprá-lo aos vendedores”.

Se analisássemos cada pormenor da parábola, certamente que esta parte destoava da mensagem da partilha e da dádiva, mas, como é óbvio, não se trata de egoísmo ou da recusa em partilhar, trata-se da vida que ninguém pode viver pelos outros. A vida que não se gasta, fica por gastar; a vida que não se vive, fica desperdiçada, não se recupera só porque envelhecemos ou temos mais disponibilidade ou melhores condições de vida. Para aqueles que se lembram do final d’ “Os Maias”, será que ainda vamos a tempo? Será que ainda apanhamos o comboio (elétrico) da vida?

Todas as virgens adormeceram! O descanso faz parte da vida. O que nos pede Jesus, não é a renúncia ao sono, mas às trevas. Pode-se dormir, claro que pode, afinal é uma característica humana. O cristão não é mais do que os outros, não é um super-homem. O essencial é a ligação que se mantém com Jesus, acumulando sabedoria, praticando o bem, deixando-se purificar pela Luz que vem do alto, para ser luz também para os demais. A verdadeira esperança faz-nos viver hoje, comprometidos totalmente com Deus, totalmente com o próximo. A vigilância faz-nos, não adiar a vida para melhores tempos, mas vivê-la agora, com tudo o que humanamente é possível e com as possibilidades que Deus nos dá.

3 – Até durante o sono, o Senhor nosso Deus cuida de nós (cf. Sl 127). Seguindo a lógica da parábola de Jesus sobre o reino de Deus, a vigilância consiste em manter-nos sob a luz, fiéis à sabedoria divina, alimentando a fé através da caridade.

A fé e as obras estão intimamente ligadas; as palavras e a ação iluminam-se mutuamente. As palavras, que brotam do coração, despertam propósitos e comprometem-nos na transformação do mundo. As boas ações justificam e clarificam as nossas palavras, dão-lhe vida e carne, despertando para novos compromissos.

Vigiar também é isto: deixar-se envolver pela sabedoria que vem de Deus. A sabedoria “deixa-se ver facilmente àqueles que a amam e faz-se encontrar aos que a procuram. Antecipa-se e dá-se a conhecer aos que a desejam. Quem a busca desde a aurora não se fatigará, porque há de encontrá-la já sentada à sua porta. Meditar sobre ela é prudência consumada e quem lhe consagra as vigílias depressa ficará sem cuidados”.

A condição para alcançarmos a sabedoria é esvaziar-se de si, para se deixar inundar de sabedoria, é deixar-se alcançar por ela. Quem se vangloria nos seus conhecimentos, dificilmente encontrará a sabedoria. A Sabedoria de Deus, que devemos almejar, é o próprio Jesus Cristo, a Sua palavra e a Sua vida oferecida para nossa salvação. A dormir ou acordados, o decisivo é a cumplicidade que mantemos com Jesus. É essa a sabedoria que nos revela que somos filhos do Deus Altíssimo e, portanto, irmãos em Jesus Cristo.

4 – Buscar a sabedoria de Deus é buscar o próprio Deus e acolhê-l’O em nosso coração, na nossa vida e fazer que habite em nossa casa.

O salmista faz-se tomar consciência desta busca em forma de oração: “Senhor, sois o meu Deus: desde a aurora Vos procuro. A minha alma tem sede de Vós. Por Vós suspiro, como terra árida, sequiosa, sem água. / Quero contemplar-Vos no santuário, para ver o vosso poder e a vossa glória. A vossa graça vale mais que a vida; por isso, os meus lábios hão de cantar-Vos louvores”. O louvor e a procura são constantes. Quem de dia está sintonizado com Deus, manterá a mesma sintonia durante a noite. “Quando no leito Vos recordo, passo a noite a pensar em Vós. Porque Vos tornastes o meu refúgio, exulto à sombra das vossas asas”.

É uma busca confiante. Abrimos a nossa mente e o nosso coração, predispomos a nossa vida, e Deus não Se faz rogado, vem, envolve-nos com a Sua ternura e bondade.

5 – Com a Sua vinda, com as Suas palavras e gestos, com a Sua morte e ressurreição, Jesus garante-nos a vida em plenitude, aquela vida que não se encerra no hiato de tempo que vai do nascimento à morte, mas vida que vem de Deus e em Deus se tornará plena. Desde sempre, como sublinhava Bento XVI, desde sempre vivemos no pensamento de Deus e para sempre permaneceremos, pois Aquele que ressuscitou Jesus também nos ressuscitará a nós. É a nossa fé iluminada pela esperança.

O apóstolo fala abertamente: “Não queremos, irmãos, deixar-vos na ignorância a respeito dos defuntos, para não vos contristardes como os outros, que não têm esperança”. E logo são Paulo prossegue, dizendo: “Se acreditamos que Jesus morreu e ressuscitou, do mesmo modo, Deus levará com Jesus os que em Jesus tiverem morrido”. Cada um na sua vez. Ninguém vive em vez de outro e também ninguém morre em vez de outro. Bem entendido! Jesus morreu por nós, para nos redimir, mas não morreu em nossa vez, pois também nós morreremos! A morte, contudo, não é definitiva, definita é a vida, assegurada pelo amor de Deus. “Estaremos sempre com o Senhor”.

6 – Antes disso, vivamos vigilantes o hoje, sem esperar que o tempo seja melhor amanhã, pois o hoje é o que temos para viver. Sem dramas, porque confiamos no Senhor, que não nos deixará na morte. Identificamo-nos agora com Ele, para que quando chegarmos, em definitivo, à Sua presença, Ele nos reconheça, identificando-nos e assumindo-nos como Seus filhos.

“Deus omnipotente e misericordioso, afastai de nós toda a adversidade, para que, sem obstáculos do corpo ou do espírito, possamos livremente cumprir a vossa vontade”.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Sb 6, 12-16; Sl 62 (63); 1Ts 4, 13-18 ou 1Ts 4, 13-14; Mt 25, 1-13.