Domingo XV do Tempo Comum -ano C – 2022

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Domingo XV do Tempo Comum -ano C – 2022

1 – Jesus é o Bom Samaritano, por excelência, faz-Se próximo, tão próximo de mim e de ti, de todos, que Se confunde connosco; tão próximo que Se deixa ver, prender, crucificar; tão próximo que O podemos tocar para d’Ele recebermos a força da ternura de Deus. Sendo Deus, não Se vale da omnipotência, mas humilha-Se até estar da nossa estatura, assumindo os nossos sofrimentos, as nossas chagas, para as curar, para nos redimir e nos fazer participantes da Sua vida divina.

Um doutor da Lei quis experimentar Jesus, para O expor, para mostrar a todos que, diante de questões religiosas mais elaboradas, Ele meteria os pés pelas mãos: «Mestre, que hei de fazer para receber como herança a vida eterna?». Jesus devolve-lhe a pergunta, pois um Mestre da Lei terá que ser um conhecedor profundo da mesma. E a resposta é imediata: «Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração e com toda a tua alma, com todas as tuas forças e com todo o teu entendimento; e ao próximo como a ti mesmo».

Fez a pergunta e deu a resposta! Aparentemente está tudo dito! Jesus confirma o veredito, desafiando a fazer o que diz a Lei. Apanhado em contramão, o doutor da Lei volta a questionar Jesus: «E quem é o meu próximo?».

Dá a impressão que são discussões estéreis! Mas muitas vezes as discussões servem apenas de desculpa ou justificação para não meter mãos à obra, para deixar que o tempo resolva ou outros se comprometam. Próximo é quem precisa de mim? É meu familiar e amigo? O meu vizinho? A pessoa que professa a mesma fé que eu? É do mesmo partido? É meu conterrâneo? Perfilha o mesmo clubismo? Um estrangeiro, refugiado, um estranho é meu próximo?

2 – Não adianta explicar a quem não quer compreender. Ainda assim, não argumentando, Jesus faz com que o doutor da Lei reflita e tire ilações, através de uma parábola. Como história, há liberdade para o ouvinte tirar as próprias conclusões. A argumentação é impositiva e por vezes cada um fica com o que lhe parece, nesta pequena história dá para que a pessoa se sinta envolvida, chamada para dentro da história, interiorizando a mensagem.

«Um homem descia de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos dos salteadores. Roubaram-lhe tudo o que levava, espancaram-no e foram-se embora, deixando-o meio- morto. Por coincidência, descia pelo mesmo caminho um sacerdote; viu-o e passou adiante. Do mesmo modo, um levita que vinha por aquele lugar, viu-o e passou também adiante. Mas um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele e, ao vê-lo, encheu-se de compaixão. Aproximou-se, ligou-lhe as feridas deitando azeite e vinho, colocou-o sobre a sua própria montada, levou-o para uma estalagem e cuidou dele. No dia seguinte, tirou duas moedas, deu-as ao estalajadeiro e disse: ‘Trata bem dele; e o que gastares a mais eu to pagarei quando voltar’».

Depois da parábola, é a vez de Jesus questionar o doutor da Lei, o especialista em Sagrada Escritura: «Qual destes três te parece ter sido o próximo daquele homem que caiu nas mãos dos salteadores?».

As dúvidas estão desfeitas! É próximo quem se aproxima para ajudar: «O que teve compaixão dele». O foco, neste caso, não são os outros, mesmo os que precisam de ajuda, mas tu e eu, se percebemos as necessidades dos nossos semelhantes e se temos urgência em ajudá-los. Sou próximo se me faço próximo. «Então vai e faz o mesmo».

3 – Como sempre, não basta saber, é preciso fazer, não chegam as intenções, é preciso pôr mãos às obras, não são suficientes os propósitos, urge colocar-se a caminho. Claro que o conhecimento, as intenções e os propósitos predispõem-nos para o compromisso em ação. Ninguém ama o que desconhece. Faz-se caminho dando o primeiro passo. Vai e faz do mesmo jeito!

É deste modo que começamos a Eucaristia, pedindo a Deus que dilate o nosso coração, impelindo-nos a conformar a nossa vontade com os Seus desígnios: “Senhor nosso Deus, que mostrais aos errantes a luz da vossa verdade para poderem voltar ao bom caminho, concedei a quantos se declaram cristãos que, rejeitando tudo o que é indigno deste nome, sigam fielmente as exigências da sua fé”.

Tal como o doutor da Lei, nós conhecemos os desígnios de Deus revelados pelos Seus mensageiros. Na primeira leitura, Moisés, ao comunicar o Mandamento de Deus ao Povo, diz claramente que está ao alcance de todos cumpri-lo, não é uma sobrecarga, mas um compromisso que liberta e aproxima. Não são preceitos complexos, distantes, inscritos no Céu! «Escutarás a voz do Senhor teu Deus, cumprindo os seus preceitos e mandamentos que estão escritos no Livro da Lei, e converter-te-ás ao Senhor teu Deus com todo o teu coração e com toda a tua alma… Esta palavra está perto de ti, está na tua boca e no teu coração, para que a possas pôr em prática».

Ainda que venha de fora, de Deus, do Céu, o Mandamento do Senhor interioriza-se, pois não visa ser um fardo, mas uma ajuda, iluminando as nossas escolhas e mostrando-nos o caminho que nos humaniza, irmana e nos salva dos nossos egoísmos e preconceitos.

4 – A oração faz-nos descentrar de nós, para nos centrar em Deus e nos Seus desígnios de amor. Fixando-nos em nós, por mais apetências que tenhamos, por mais resiliência que possuamos, acabaremos por soçobrar ou por nos endeusarmos.

“Eu sou pobre e miserável: defendei-me com a vossa proteção. Louvarei com cânticos o nome de Deus e em ação de graças O glorificarei”. Centrando-nos em Deus e colocando o nosso coração e a nossa vida n’Ele, procurando sintonizar a nossa com a Sua vontade, a confiança de que Ele nos traz a paz na tormenta e a alegria na adversidade, garantindo-nos a vida, no tempo e na eternidade.

Deixemo-nos guiar pelo salmista: “A Vós, Senhor, elevo a minha súplica, pela vossa imensa bondade respondei-me. Ouvi-me, Senhor, pela bondade da vossa graça, voltai-Vos para mim pela vossa grande misericórdia”. O desafio que a oração nos lança, é para nós e para todos. “Vós, humildes, olhai e alegrai-vos, buscai o Senhor e o vosso coração se reanimará. O Senhor ouve os pobres e não despreza os cativos. Os seus servos a receberão em herança e nela hão de morar os que amam o seu nome”.

A oração também é catequese, pois nos ensina a olhar para Deus com humildade e a caminharmos juntos, com todos aqueles que procuram a verdade e a bondade. Não há oração que não seja compromisso, pessoal, de transformação, procurando acolher a vontade de Deus, e na predisposição firme e séria de trabalhar por um mundo mais justo e fraterno, o que implica a atenção primeira aos mais desfavorecidos.

5 – Jesus Cristo é o Bom Samaritano e o paradigma para nós, individualmente e como comunidade. Ele é o chão, a referência, o ponto de partida, a meta, o contexto em que havemos de gastar e viver a nossa vida.

São Paulo sublinha que «Cristo Jesus é a imagem de Deus invisível, o Primogénito de toda a criatura; porque n’Ele foram criadas todas as coisas no céu e na terra, visíveis e invisíveis… por Ele e para Ele tudo foi criado. Ele é anterior a todas as coisas e n’Ele tudo subsiste. Ele é a cabeça da Igreja, que é o seu corpo. Ele é o Princípio, o Primogénito de entre os mortos; em tudo Ele tem o primeiro lugar. Aprouve a Deus que n’Ele residisse toda a plenitude e por Ele fossem reconciliadas consigo todas as coisas, estabelecendo a paz, pelo sangue da sua cruz, com todas as criaturas na terra e nos céus».

Ele, Deus connosco, salva-nos, redime-nos, integra-nos na Sua vida divina; faz-Se nosso irmão, faz-nos Seus amigos e herdeiros das bênçãos divinas. Cabe-nos abrir o nosso coração e a nossa vida, e respirar e expirar o Seu Espírito de Amor.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (C): Deut 30, 10-14; Sl 68 (69); Col 1, 15-20; Lc 10, 25-37.