Domingo II do Tempo Comum – C – 2022

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Domingo II do Tempo Comum – C – 2022

1 – Deus que Se faz igual a nós, exceto no pecado, lembra-nos São Paulo, em Jesus, assume a nossa natureza carnal, humana e finita, entranha-Se. Jesus não é nem um super-homem nem um extraterrestre (ET). Com certeza que, sendo verdadeiro Deus, é envolvido no mistério que traz da eternidade, mas esconde-Se entre nós, confunde-Se connosco, identifica-Se biológica, cultural, religiosa e temporalmente connosco. A Sua grandeza está no amor, frágil e pobre, sem máscaras, sem poder, sem exército; revestido de compaixão, de ternura e de bondade.

O batismo revela-O como Filho bem-Amado de Deus. João reconhece-O como Aquele a Quem não é digno de desatar as sandálias. Ao aproximar-Se para ser batizado, João ainda Lhe diz que o normal seria Ele batizar e não ser batizado, já que é o Messias, sem mancha de pecado, mais, é o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Mas Jesus, depois da multidão, e com a multidão aproxima-Se e faz-Se batizar. Está “misturado”, é um de nós, é um connosco. Caminha nos trilhos da humanidade.

De João, é o próprio Jesus a reconhecê-lo, dir-se-á que é excêntrico. João Batista vive afastado da convivência social, no deserto, e alimenta-se do que encontra, gafanhotos e mel silvestre. Em contraponto, Jesus “passa” despercebido, de tão despercebido que é confundido com um mendigo, salteador, um pecador que Se mistura com os pecadores e publicanos.

No início da vida pública, Jesus está inserido nas vivências familiares e sociais, nas bodas de um casamento. E, não fosse Maria, Sua Mãe, Jesus entrava e saía da festa sem ser notado.

2 – Maria, a Mãe de Jesus, é uma das convidadas, bem como Jesus e os Seus discípulos. O Evangelho faz-nos centrar a atenção em Maria. Com efeito, Maria surge em Caná e, no evangelho de São João, volta a estar em destaque junto à Cruz. É uma inclusiva (quase) perfeita: em Caná, começa por “apressar” a hora de Jesus, desafiando-O a intervir; junto à Cruz, recebe a missão de se tornar também nossa Mãe, Mãe da Igreja. A intercessão continua ao longo da história! Durante a vida pública de Jesus, Maria como que sai de cena, mantendo-se por perto, mas no silêncio, em oração, nas lides de casa, atenta ao que lhe vêm dizer acerca do Seu Filho, confiando (sempre) que Deus O protegerá. Tendo presente Caná e a Cruz, Maria só aparentemente está ausente. Jesus deixa vir ao de cima o que aprendeu com Maria e com José: a docilidade, a integração na sociedade, nos momentos de festa e de luto, a atenção aos outros, o cuidado aos mais pobres, a ternura para com todos mas especialmente para os menores da sociedade.

Percebendo os gestos, a vigilância, a atenção maternal de Maria, percebemos melhor a compaixão de Jesus. Antes de todos os outros, Maria dá conta que o vinho faltou. Numa boda, tornava-se um descalabro, pois era um ingrediente fundamental para a festa. Poderíamos aqui intentar várias condicionantes: os convivas terem bebido mais que o expectável; a família não ter recursos para a abundância da boda, ainda que quisesse manter a tradição para os vários dias de festa e o convite alargado a familiares, amigos e vizinhos; alguns convidados de última hora, já não esperados, e que alteraram os cálculos; o prolongamento da festa por mais alguns dias! Mas tudo isso são conjeturas nossas. O que nos diz o texto é que o vinho veio a faltar e seria uma vergonha para aquela família. Maria é perentória: «Não têm vinho». Não se alonga em comentários. Passa a batata quente para Jesus: não têm vinho, faz qualquer coisa, desenrasca-Te.

3 – Como é que Jesus reage? Começa por Se colocar no nosso lugar: que é que temos a ver com isso, nós somos convidados, não temos responsabilidade sobre as decisões dos outros, se eles convidaram deveriam ter calculado as despesas que era necessário efetuar?! Logo acrescenta que ainda não chegou a Sua hora, a hora de Se manifestar!

A Mãe de Jesus não se dá por vencida, nem pouco mais ou menos! As Mães muito raramente se dão por vencidas, ainda que neste caso seja em relação a outra família. Volta-se para os serventes com uma ordem direta: «Fazei tudo o que Ele vos disser». A firmeza com que os interpela revela a confiança que tem em Jesus. E Ele não a deixa ficar mal. Bem podemos esperar de Maria que, ao interceder por nós, nos obtenha as graças que pedimos ao Senhor!

Por outro lado, o mandato de Maria leva-nos a escutar Jesus e a procurar realizar o que Ele nos pede. Jesus age, mas conta connosco. Enchamos as bilhas, levemo-las aos convivas, façamos a parte que nos toca, Deus fará a parte que Lhe toca, e a água transforma-se em vinho, em vinho bom e abundante, o vinho do Reino de Deus.

Os sinais estão todos neste primeiro milagre de Jesus. Ele vem para salvar, não apenas numa situação, mas a humanidade por inteiro, introduzindo-nos na abundância do Reino de Deus, contando que procuremos realizar o Seu mandamento. Se dúvidas ou hesitações nos impedirem de avançar, se estivermos perdidos, recorramos a Maria e confiemos, mais uma vez, nas suas recomendações, fazendo como Ela, colocando-nos nas mãos de Deus: faça-se em mim segundo a Sua vontade.

4 – Como numa família, em comunidade, todos temos uma missão importante, cada um pode e deve fazer o que lhe compete para o bem dos outros. Assim foi nas Bodas de Caná: Maria, Jesus, serventes fazem o que está ao seu alcance!

Isto mesmo nos lembra o Apóstolo São Paulo: “Há diversidade de dons espirituais… de ministérios… de operações, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. Em cada um se manifestam os dons do Espírito para o bem comum”.

Os dons que Deus nos dá aproximam-nos, irmanam-nos, tornam-nos Corpo de Cristo que é a Igreja.

5 – Vivemos um ano especialmente dedicado à missão e, como nos lembrava o Papa Francisco, temos uma missão, somos uma missão. Em todos os momentos, a favor de todos, em todas as circunstâncias, o nosso compromisso é com o Evangelho, somos discípulos missionários, próximos de Jesus, aprendendo com Ele para deixarmos que Ele fale e atue através de nós, pelo Seu Espírito, na oração, nas palavras e nas obras.

São incisivas as palavras de Isaías, mostrando como Deus não desiste da humanidade e como os Seus mensageiros devem levantar a voz: “Por amor de Sião não me calarei, por amor de Jerusalém não terei repouso, enquanto a sua justiça não despontar como a aurora e a sua salvação não resplandecer como facho ardente. Os povos hão de ver a tua justiça e todos os reis a tua glória”.

É também esse o desafio do Salmo, com que respondemos à Palavra de Deus: “Anunciai dia a dia a sua salvação, publicai entre as nações a sua glória, em todos os povos as suas maravilhas. Dai ao Senhor, ó família dos povos, dai ao Senhor glória e poder, dai ao Senhor a glória do seu nome. Adorai o Senhor com ornamentos sagrados, trema diante d’Ele a terra inteira; dizei entre as nações: «O Senhor é Rei», governa os povos com equidade”.

A oração eleva-nos para Deus, mas compromete-nos com o que pedimos, sintoniza-nos com Aquele que louvamos, com a Sua vontade, e a Sua vontade é que todos sejamos felizes, sejamos salvos.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano C): Is 62, 1-5; Sl 95; 1 Cor 12, 4-11; Jo 2, 1-11.