Domingo IV da Páscoa – ano A – 2023

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Domingo IV da Páscoa – ano A – 2023

1 – A oração de coleta, no início da Eucaristia, situa este Domingo, o do Bom Pastor: «Deus todo-poderoso e eterno, conduzi-nos à posse das alegrias celestes, para que o pequenino rebanho dos vossos fiéis chegue um dia à glória do reino, onde já Se encontra o seu poderoso Pastor, Jesus Cristo, vosso Filho».

A Semana de Oração pelas Vocações aponta para Ele, o Senhor da vida, do tempo e da história e da nossa relação com Ele. O contexto é pascal. Jesus assume-se como o Bom Pastor, dá a Sua vida pelas Suas ovelhas, gasta-Se para que desfrutemos da abundância da vida. Ele veio para nos reunir e congregar, para nos resgatar ao poder do mal e das trevas, para nos mostrar que há mais vida para lá das nossas limitações, fragilidades e finitude.

É feliz a imagem do Bom Pastor, analogia já presente no Antigo Testamento. Com efeito, David foi o Pastor que o Senhor escolheu para Rei. Jesus, às portas de Jerusalém, é aclamado como o Filho de David. Na história dos dois gémeos, Esaú e Jacob, é este que, sendo pastor, “arrecada” a bênção de Isaac, assumindo-se assim como parte da raiz do povo eleito. Deus, através dos Profetas, faz saber que Ele próprio virá, como Pastor, apascentar o Seu rebanho, o Seu povo.

Belíssimo o salmo que hoje nos é servido para acolhermos a Palavra de Deus e para respondermos às suas interpelações. Este salmo, como os demais, é atribuído ao grande Rei-Pastor, David. Não sendo o autor material, David serviu de inspiração aos poetas.

«O Senhor é meu pastor: nada me falta. Leva-me a descansar em verdes prados, conduz-me às águas refrescantes e reconforta a minha alma. / Ele me guia por sendas direitas por amor do seu nome. Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos, não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo: o vosso cajado e o vosso báculo me enchem de confiança. / Para mim preparais a mesa à vista dos meus adversários; com óleo me perfumais a cabeça e o meu cálice transborda. Refrão A bondade e a graça hão de acompanhar-me, todos os dias da minha vida, e habitarei na casa do Senhor para todo o sempre».

É um salmo de confiança em Deus. A promessa de Deus – Ele virá apascentar o Seu rebanho – é visualizada, visualizável e agradecida em jeito de oração, de louvor e gratidão.

2 – Jesus correlaciona a imagem do Bom Pastor, do porteiro e da porta, sublinhando como a Sua vida é oferecida e gasta pelas ovelhas do rebanho.

O que entra pela porta é o porteiro, abre a porta às ovelhas, elas conhecem a sua voz e ele chama-as a cada uma pelo seu nome. Este é o agir e o cuidado que Deus tem por nós, por mim e por ti. Ama-nos antes de o merecermos e continua a amar-nos quando o desmerecemos. Jesus, presença e rosto de Deus no mundo, mostra-nos como amar, como ser autenticamente humanos, como nos reconhecermos irmãos e agirmos solidariamente.

O Bom Pastor acompanha as suas ovelhas, aponta-lhes o caminho, leva-as às melhores pastagens. Contrapõe-se ao Bom Pastor, ao Porteiro, aquele que não entra pela porta, esse é ladrão e salteador.

A imagem da porta reforça esta assunção de Jesus como Bom Pastor: «Eu sou a porta das ovelhas. Aqueles que vieram antes de Mim são ladrões e salteadores, mas as ovelhas não os escutaram. Eu sou a porta. Quem entrar por Mim será salvo: é como a ovelha que entra e sai do aprisco e encontra pastagem. O ladrão não vem senão para roubar, matar e destruir. Eu vim para que as minhas ovelhas tenham vida e a tenham em abundância».

Jesus traz do Céu a bondade e a ternura de Deus e faz-nos participantes da sua vida divina. Confia-Se a nós, coloca a Sua vida em nossas mãos. Gasta-Se inteiramente por nós, para que descubramos como viver com alegria, em jeito de gratidão e serviço.

3 – Os apóstolos tiveram um longo caminho de aprendizagem. As coisas levam o seu tempo. Nem sempre compreendem as palavras de Jesus, nem sempre percebem a Sua forma de agir. Como pode o Messias ser frágil, deixar-Se perseguir e matar? Como é que o poder é o serviço? Como é que amando se salva a humanidade?

Levou tempo, foi preciso que Jesus morresse! Melhor, foi preciso que Jesus ressuscitasse, para então entenderem que o que nos leva ao Céu é a fé, o amor concretizado em serviço, perdão, entreajuda. Na verdade, basta acreditar! Acreditar em Jesus, acreditar que Jesus é o Filho amado de Deus, que foi morto, mas voltou à vida, está vivo na comunidade que se reúne em Seu nome, na palavra de Deus, na celebração dos Sacramentos, no bem que se propaga em Seu nome. Basta acreditar em Jesus. Acreditar compromete-me com Ele numa lógica de confiança e cumplicidade. Este acreditar implicar colocar os nossos créditos n’Ele, como Filho de Deus, que nos assume como irmãos. Acreditar e amar implicam-se mutuamente. Quando amamos, procuramos ser agradáveis, corresponder, identificando-nos com a pessoa amada.

A determinada altura, os discípulos acharam que iriam ter uma vida luxuosa! Veriam, porém, que Jesus os chamava a uma vida em abundância, comprometida, disponível para viver e realizar milagres, para semearem esperança e amor.

Vejamos a transformação de Pedro. Homem simples, um tanto ou quanto rude, pescador, com o coração ao pé da boca, impulsivo, com muitos entusiasmos, mas sem firmeza. A sua fé foi testada pelo fogo! O fogo de amor com Jesus Se entregou por nós, com o risco de que lhes aconteça o mesmo que ao Mestre. Perseguidos, ultrajados, mortos por causa d’Ele também por Ele serão restituídos à vida.

Ouçamos Pedro: «Saiba com absoluta certeza toda a casa de Israel que Deus fez Senhor e Messias esse Jesus que vós crucificastes». Dispostos a ouvir e a acolher as suas palavras, Pedro diz-lhes, e diz-nos, o que fazer: «Convertei-vos e peça cada um de vós o Batismo em nome de Jesus Cristo, para vos serem perdoados os pecados. Recebereis então o dom do Espírito Santo, porque a promessa desse dom é para vós, para os vossos filhos e para quantos, de longe, ouvirem o apelo do Senhor nosso Deus».

A fé dilata o nosso coração e dispõe-nos, como Jesus, a sermos abundância e bênção na vida dos nossos irmãos. É esse o caminho que nos insere na vida divina, no Reino de Deus.

4 – Na segunda leitura podemos, novamente, saborear as palavras de Pedro e deixarmo-nos desafiar por ele. Diz Pedro: «Se vós, fazendo o bem, suportais o sofrimento com paciência, isto é uma graça aos olhos de Deus. Para isto é que fostes chamados, porque Cristo sofreu também por vós, deixando-vos o exemplo, para que sigais os seus passos. Ele não cometeu pecado algum e na sua boca não se encontrou mentira. Insultado, não pagava com injúrias; maltratado, não respondia com ameaças; mas entregava-Se Àquele que julga com justiça. Ele suportou os nossos pecados no seu Corpo, sobre o madeiro da cruz, a fim de que, mortos para o pecado, vivamos para a justiça: pelas suas chagas fomos curados. Vós éreis como ovelhas desgarradas, mas agora voltastes para o pastor e guarda das vossas almas».

A referência é Cristo, o Bom Pastor, que deu a vida por nós, suportando os nossos pecados, curando-nos da morte, das trevas, do egoísmo, libertando-nos para vivermos na verdade e na justiça, para nos “suportarmos” uns aos outros, como Ele suportou as nossas enfermidades. Ele é o nosso suporte! Sejamos o suporte para os outros, que em nós vislumbrem o amor de Deus e através de nós se sintam atraídos para o Seu reino de vida e de paz.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Atos 2, 14a. 36-41; Sl 22 (23); 1 Pedro 2, 20b-25; Jo 10, 1-10.