Domingo XII do Tempo Comum – ano C – 2022

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Domingo XII do Tempo Comum – ano C – 2022

1 – Jesus questiona os Seus discípulos acerca da sua profissão de fé: «Quem dizeis que Eu sou?».

Antes desta pergunta direta e dirigida, concreta e a exigir uma resposta pessoal, Jesus pergunta sobre o que se diz a Seu respeito. Aparentemente, sobrevém a curiosidade de Jesus sobre Si mesmo, sobre a influência que terá nas pessoas. Mas só aparentemente, porque o decisivo não é a opinião pública, difusa, assim-assim, mas a minha e a tua resposta.

Amigos e diplomáticos, os apóstolos falam acerca do que se diz por aí: «Uns, dizem que és João Baptista; outros, que és Elias; e outros, que és um dos antigos profetas que ressuscitou». Nada que não possamos dizer a um amigo se nos perguntasse se tínhamos ouvido alguma coisa a seu respeito. Alguns diriam o que ouviram. Outros pôr-lhe-iam uma acentuação insultuosa, até para criar uma maior inimizade com quem o disse… e outros, que considero amigos verdadeiros, ponderariam se valia a pena estarem a vincar algum comentário desagradável, a não ser por precaução, e apostariam em valorizar o que se dizia de bem. Assim fazem os Apóstolos. O Evangelho mostra-nos outras opiniões acerca de Jesus. Dirão alguns que Ele anda com o diabo no corpo, que é um tresloucado, um pecador entre pecadores.

2 – A opinião pública é essencial para alguns. Obviamente ninguém gosta de ouvir comentários negativos a seu respeito. Para alguns é uma tortura, fonte de mal-estar e de irritação. Há pessoas que agem ou deixam de agir em função do que os outros vão pensar ou dizer. Seguindo esse critério, Jesus remeter-se-ia a casa, a Nazaré, e regressava a uma vida pacata, tranquila, com o trabalho, por vezes árduo, mas sem estar sujeito a comentários acintosos. Nas nossas comunidades paroquiais, há colaboradores próximos que, muitas vezes, se cansam do que se diz sobre eles, e alguns desistem porque não querem estar sujeitos a comentários mordazes só porque têm alguma atividade mais na paróquia. Quem não se sente, não é filho de boa gente. Compreendendo essa decisão, pois o degaste acumula-se, tanto quanto possível, o persistir impede que os maldizentes se regozijem.

Todavia, Jesus não perde muito tempo a refletir sobre o que se diz, sabendo dos filtros usados pelos Seus discípulos. O decisivo é a profissão de fé dos discípulos: quem dizeis vós que Eu sou? Que importância tenho nas vossas vidas? Como é Me dais a conhecer a quem não Me conhece? questionamento é também para nós. Quem é Jesus para nós? Que importância tem na nossa vida? Como é que O dizemos, como é que O testemunhamos? Uma personagem da história? Um revolucionário? Um humanista?

A resposta de Pedro leva-nos mais longe: «És o Messias de Deus». A identidade de Jesus está para além das aparências e da opinião pública. Para evitar qualquer tipo de idolatria, Jesus proíbe os discípulos, por enquanto, de revelarem a Sua identidade.

3 – Confessar que Jesus é o Messias de Deus pode não ser clarificador. É o Messias, é o Ungido do Senhor, o Seu Eleito, o Enviado! Mas que implicações poderá ter na minha vida? O que altera nas minhas opções?

Os judeus, escutando os Profetas, esperavam um Messias, mas com muitas cores possíveis e muitos rostos. Um Rei dominador? Um Profeta investido de poder? Um sacerdote destruidor dos maus? Isaías aponta para o Servo sofredor, mas, em definitivo, não há certezas de como será, donde virá, com que poder estará revestido! Daí a dificuldade em aceitar Jesus como Messias. O pobre de Nazaré faz-Se acompanhar por um grupo de maltrapilhos, assalariados, pecadores, publicanos, pessoas de honra duvidosa; próximo dos excluídos, doentes, pobres, crianças; relaciona-se publicamente com mulheres, algumas das quais integram o Seu “bando”, e com estrangeiros… É difícil perceber que Ele é o Messias de Deus! Esperava-se um “desconhecido”, vindo de parte incerta, com esplendor e poder, com um forte exército para derrotar os colonizadores! Em vez de um Rei, poderoso e distante, um homem simples, humilde, igual a nós, misturando-se e confundindo-se com os outros homens.

De uma assentada, Jesus diz ao que vem e o que vai acontecer: «O Filho do homem tem de sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas; tem de ser morto e ressuscitar ao terceiro dia».

É o programa de vida de Jesus… o Filho do Homem vai ser morto, em consequência da Sua pobreza e do Seu amor, e ressuscitará ao terceiro dia, pois o Seu projeto há de perdurar até à vida eterna.

4 – A resposta pronta de Pedro precisa ainda de ser temperada pelo tempo e pela experiência da paixão redentora de Jesus, da prisão, julgamento, condenação, morte e ressurreição. Há muito caminho a ser feito. A intuição de Pedro é inspirada, mas nem ele sabe muito bem o que disse. No Evangelho de São Mateus, Jesus diz-lhe: «Feliz de ti, Simão, filho de Jonas, porque não foram a carne e o sangue que to revelaram, mas sim meu Pai que está nos Céus».

Na mesma ocasião se verá Pedro a repreender Jesus por ser transparente e anunciar as dificuldades que vêm pela frente.

A mim e a ti, a Pedro e a João, à Maria e ao Miguel, a todos Jesus diz: «Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz todos os dias e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida, há de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, salvá-la-á».

As promessas de Jesus não iludem com facilidades, pois Ele bem sabe que o amor, como a verdade, conduz ao despojamento, à pobreza, às injúrias, provocará dissensões, ódios e invejas. Claro que também envolve a alegria. Quem dá, quem se dá, sente-se preenchido pelo bem que faz, mesmo que a ingratidão e a injustiça sejam amargas.

Seguir Jesus implica-nos por inteiro, não se coaduna com reservas, condições, com compartimentos, com calculismos. Quem guarda para si o tempo e a vida, perde-se; quem se perde, dando-se, gastando-se por amor, alcança a vida, alcança Jesus.

5 – “Senhor, fazei-nos viver a cada instante no temor e no amor do vosso santo nome, porque nunca a vossa providência abandona aqueles que formais solidamente no vosso amor”.

A Eucaristia inicia-nos com esta oração de súplica. Pedimos o temor e o amor, confiando na providência e no amor de Deus. A promessa do profeta envolve-nos no perdão de Deus que nos leva além do pranto e das adversidades. A primeira leitura faz-nos colidir com a realidade, tal como, depois, no evangelho. Deus providenciará, mas teremos que atravessar as tempestades da vida. «Sobre a casa de David e os habitantes de Jerusalém derramarei um espírito de piedade e de súplica… Naquele dia, haverá grande pranto em Jerusalém… Naquele dia, jorrará uma nascente para a casa de David e para os habitantes de Jerusalém, a fim de lavar o pecado e a impureza».

Se nos fixarmos nas nossas limitações e pecados, sobrevirá a desolação; se nos deixarmos guiar pela fé, pela confiança em Deus, pela certeza do Seu amor por nós, então, até na adversidade, saberemos levantar a cabeça a estender as mãos para o Senhor.

O salmo guia-nos para esta entrega confiante: «Senhor, sois o meu Deus: desde a aurora Vos procuro. A minha alma tem sede de Vós. Por Vós suspiro, como terra árida, sequiosa, sem água. A vossa graça vale mais que a vida: por isso os meus lábios hão de cantar-Vos louvores… em vosso louvor levantarei as mãos… Porque Vos tornastes o meu refúgio, exulto à sombra das vossas asas. Unido a Vós estou, Senhor, a vossa mão me serve de amparo».

O pobre clamou e o Senhor ouviu a sua voz. A voz do humilde chega ao coração de Deus.

6 – São Paulo diz a fé em vários tons, de viva voz e na escrita, no meio de judeus ou em território estrangeiro. Também a ele, Jesus perguntou: e tu quem dizes que Eu sou? O perseguidor tornou-se seguidor. O Perseguido alcança Paulo, pela graça, e desde então o Apóstolo não vacila a dizer Jesus em todos os ambientes e oportunidades, proclamando o Evangelho da caridade, o mistério da salvação desvelado, concretizado e plenizado em Jesus Cristo.

Não importa a origem, importa a transformação.

«Todos vós sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo, porque todos vós, que fostes batizados em Cristo, fostes revestidos de Cristo. Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; todos vós sois um só em Cristo Jesus. Mas, se pertenceis a Cristo, sois então descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa».

O Messias de Deus veio salvar, redimir, reunir e fazer de todos uma só família.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (C): Zac 12, 10-11; 13,1; Sl 62 (63); Gal 3, 26-29; Lc 9, 18-24.