Domingo XVII do Tempo Comum – B – 25 de julho de 2021

Watch Now

Download

Domingo XVII do Tempo Comum – B – 25 de julho de 2021

1 – Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus… Há oito dias vimos a delicadeza de Jesus com os Apóstolos, que regressam de uma jornada missionária, e como lhes proporciona um tempo de descanso e recuperação de energias, ainda que logo sobrevenha a necessidade de atender a multidão. Jesus olha para aquela multidão e sente-se compadecido por aquela gente que eram como ovelhas sem pastor. Começa a ensinar-lhes muitas coisas!

Jesus passa a outra margem. Jesus predispõe-se, sempre, não apenas figurativa, mas verdadeiramente, a passar à outra margem, para a nossa margem e a conduzir-nos para Si, para a Sua margem, para a Sua beira. Traz-nos o sonho, a vida de Deus. Faz-Se um de nós, para nos introduzir na Sua vida. Partilha os Seus dias, para que aprendamos a partilhar o nosso tempo com Ele.

Jesus sobe ao monte, senta-Se com os Seus discípulos, eu e tu podemos lá estar, ergue os olhos, para mim e para ti, para a multidão que se aproxima, e testa a fé dos apóstolos, dirigindo-se a Filipe: «Onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?».

Os fatos não encaixam por medida em toda a gente! Jesus ajusta-Se a cada situação. Ensina muitas coisas à multidão, víamos na semana passada! Hoje a multidão é diferente, as necessidades também o são, e a atitude de Jesus também é outra. Mas tudo resulta do Seu amor, da Sua ternura, atenção e serviço. Perante a multidão que se aproxima, há que atender a uma necessidade premente. Não adianta um grande discurso para uma multidão cansada e faminta.

2 – André, irmão de Simão Pedro, faz uma constatação com a mesma dúvida de Filipe. «Está aqui um rapazito que tem cinco pães de cevada e dois peixes. Mas que é isso para tanta gente?»

Os discípulos continuam a pensar nos problemas que têm pela frente: muita gente, pouca comida! Também hoje há muita gente esfomeada! E há comida em abundância e desperdício de alimentos às toneladas. Os problemas persistem, porque continua a não se fazer tudo, o necessário, o que está ao alcance de cada um. Nem todos temos o mesmo nível de responsabilidade, mas somos todos responsáveis por todos.

Cinco pães e dois peixes já é alguma coisa. É possível que o pouco se transforme e dê, não apenas para um rapazito, mas para outros rapazitos, para outras pessoas. Jesus conta com os cinco pães e os dois peixes, conta com o rapazito, conta comigo e contigo, conta com os discípulos. Toma os pães e os peixes, reza, abençoa e dá graças. Os pães e os peixes são distribuídos e todos comeram e ficaram saciadas e anda sobrou! «Recolhei os bocados que sobraram, para que nada se perca». 

A multiplicação dos pães e dos peixes é abundante. Este milagre, da multiplicação, e da partilha, é símbolo da abundância da Eucaristia, na qual Jesus Se dá no pão e no vinho, o Seu corpo e o Seu sangue. O Pão junta-nos à volta da mesa, congrega-nos como irmãos, como amigos. Assim foi a Última Ceia de Jesus com os apóstolos, assim são as refeições que fazemos entre nós. Assim terá de ser a Eucaristia: juntamo-nos à volta da mesa para aprenderemos a alimentar-nos da abundância que é Jesus e para fazermos com que a comunhão em Cristo nos faça irmãos.

3 – Na primeira leitura, o Profeta Eliseu mostra-nos como em Deus se buscam caminhos para enfrentar as adversidades. A fé faz milagres, faz a vida acontecer. A falta de fé empobrece-nos, limita-nos, faz-nos olhar mais para nós do que para os outros, mais para as nossas limitações do que para o poder de Deus e o Seu amor por nós.

Um homem trouxe vinte pães de cevada e trigo novo. O homem de Deus, imediatamente disse: «Dá-os a comer a essa gente». Eliseu não guardou os pães para si, pois sendo poucos não valeria a pena estar a distribuir, certo de que uns ficariam a olhar para os outros. É a preocupação sublinhada pelo seu servo: «Como posso com isto dar de comer a cem pessoas?». O servo faz contas! Olha para os pães, poucos, e as pessoas, muitas! Que fazer? Não é possível!

Eliseu, pelo contrário, olha para as pessoas e vê-as necessitadas de alimento; olha para o que tem à mão, vinte pães e confia que Deus fará o resto: «Dá-os a comer a essa gente, porque assim fala o Senhor: ‘Comerão e ainda há de sobrar’». E conforme a palavra de Deus, ainda sobrou.

Quantas vezes, ao olharmos para as dificuldades, ficamos a aguardar por melhores dias, ou que outros façam. Não nos é pedido que transformemos o mundo por inteiro, mas que façamos o que está ao nosso alcance e Deus proverá a que outros ajudem e que os milagres aconteçam. Ficar paralisado é que não adianta mesmo.

4 – O alimento, abençoado por Deus, multiplica-se e sobeja, para que haja também para os que estão fora, para os que chegarão atrasados, para os que se perderam pelo caminho, pelos que se entretiveram em outras coisas.

O salmista empresta-nos a sua pena e a sua voz para nos confiarmos à bondade do Senhor. “Abris, Senhor, as vossas mãos e saciais a nossa fome. / Todos têm os olhos postos em Vós, e a seu tempo lhes dais o alimento. Abris as vossas mãos e todos saciais generosamente. / O Senhor é justo em todos os seus caminhos e perfeito em todas as suas obras. O Senhor está perto de quantos O invocam, de quantos O invocam em verdade”.

Com Eliseu, os pães sobraram. No tempo de Jesus, naquele dia, sobraram doze cestos. Pão suficiente para todo o mundo, para as 12 tribos, que representam os povos de toda a terra, depois simbolizados também nos 12 apóstolos. É a abundância de Cristo. É a abundância da Palavra que nos liberta de medos e egoísmos. É a abundância da Eucaristia, na qual comungamos o Corpo e o Sangue de Jesus, alimento para esta vida e até à vida eterna. Alimentados no Corpo de Cristo, para, n’Ele e por Ele, nos tornarmos um só corpo, uma só família.

5 – Não é possível aproximar-nos da comunhão sem termos vontade de partilhar o que recebemos e fazer comunhão uns com os outros. Hoje há alimento em abundância (em excesso), então porque há milhares de pessoas a morrer à fome?

Ainda que prisioneiro, São Paulo mantém-se em contacto com as comunidades e faz-lhes chegar as suas interpelações: “Procedei com toda a humildade, mansidão e paciência; suportai-vos uns aos outros com caridade; empenhai-vos em manter a unidade de espírito pelo vínculo da paz. Há um só Corpo e um só Espírito, como há uma só esperança na vida a que fostes chamados. Há um só Senhor, uma só fé, um só Batismo. Há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, atua em todos e em todos Se encontra”

Num ou noutro momento, poderemos pensar que estamos próximos de Jesus, porque rezamos muito, porque escutamos a Sua palavra com agrado, participamos nas celebrações com alegria, mas só estaremos efetivamente próximos d’Ele na medida em que procurarmos o bem uns dos outros. São Paulo é categórico, mas toda a palavra de Deus é por demais evidente. Ninguém estará no coração de Deus a deixar os outros para trás ou de lado ou esquecidos ou entregues à sua sorte. Estamos no mesmo barco, porque somos todos Seus filhos bem amados.

Se há milhões de pessoas a mendigar migalhas, a vasculhar em lixeiras, subnutridas, a morrer aos poucos por falta de água e pão, é porque há muitas pessoas a não fazer o necessário para que tal não suceda. Há um logo caminho pela frente para construir verdadeira fraternidade.

A oração com que iniciámos esta Eucaristia ajuda a situar-nos diante de Deus, acolhendo a Sua misericórdia e a deixarmo-nos guiar por Ele, para que, já agora, estejamos sintonizados na comunhão do que há de vir. “Deus, protetor dos que em Vós esperam, sem Vós nada tem valor, nada é santo. Multiplicai sobre nós a vossa misericórdia, para que, conduzidos por Vós, usemos de tal modo os bens temporais que possamos aderir desde já aos bens eternos”.

O Céu não é amanhã ou depois de morrermos, não é já em plenitude, mas começa a realizar-se aqui, comigo e contigo, a caminharmos juntos, atraídos pela presença de Cristo, sob a inspiração do Espírito Santo, até chegarmos à casa paterna.

Pe. Manuel Gonçalves


Leituras para a Eucaristia: 2 Re 4, 42-44; Sl 144 (145); Ef 4, 1-6; Jo 6, 1-15.