Domingo XXXIII do Tempo Comum – B – 2021

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Domingo XXXIII do Tempo Comum – B – 2021

1 – Quem te avisa teu amigo é!

Este ditado popular, bem conhecido, alerta-nos para possíveis consequências derivadas das nossas opções. Algumas vezes parece uma lengalenga dos mais velhos em relação aos mais novos, dos pais em relação aos filhos, dos educadores em relação aos educandos. Se continuares por este caminho, mais à frente as coisas vão correr mal. É uma possibilidade. A expressão muitas vezes é dita como último recurso. A pessoa não nos ouve, ou diz que sabe o que está a fazer, ou apela à tranquilidade, pois nem tudo é o que parece.

A experiência dos mais velhos pode ajudar a visualizar resultados futuros com as escolhas e percursos atuais. Não sendo a vida a preto e branco, mas multicolor, pode até acontecer que escolhas idênticas tenham desfechos diferentes. Mas não deixa de ser uma chamada de atenção que nos predispõe a uma melhor avaliação do que fazemos e do caminho que nos propomos percorrer ou do grau de confiança que depositamos em algumas pessoas.

2 – No Evangelho deste Domingo, a caminharmos para o final do ano litúrgico, Jesus anuncia tempos de provação, de contradição, de aflição. «Naqueles dias, depois de uma grande aflição, o sol escurecerá e a lua não dará a sua claridade; as estrelas cairão do céu e as forças que há nos céus serão abaladas. Então, hão de ver o Filho do homem vir sobre as nuvens, com grande poder e glória. Ele mandará os Anjos, para reunir os seus eleitos dos quatro pontos cardeais, da extremidade da terra à extremidade do céu».

Com os sinais, e depois da tormenta e da tempestade, Jesus virá, melhor, Jesus vem para reunir e congregar os Seus eleitos. Aquilo que parece um aviso, uma espécie de ameaça lançada sobre as nossas cabeças, rapidamente se percebe que é um desafio à vigilância e à conversão. Sublinhe-se: não há um cataclismo à nossa espera, mas Jesus sempre espera por nós! Não são desgraças que se anunciam, mas a salvação além de todas as desgraças que possam ocorrer. Deus não faltará à Sua palavra.

Olhamos para o mundo e vemos conflitos, guerras, violência, catástrofes e podemos deixar-nos arrastar pela desolação, baixando os braços como se não houvesse nada a fazer, como se não pudéssemos fazer nada, ou porque de pouco adiantaria fazer alguma coisa para transformar o mundo, sabendo que depende muito mais de decisões políticas e interesses económicos. Ou como se Deus estivesse a preparar um grande castigo para nos abrir os olhos ou para nos mostrar que é Ele que manda nos destinos do mundo! Nada disso! Cabe-nos trabalhar, cuidar, transformar o mundo, tornando-o habitável e casa para todos.

3 – Há um hiato de tempo à nossa espera. O tempo que medeia entre o nosso nascimento e a nossa morte. Deus confia em nós, confia-nos o mundo. Sabemos muitas coisas, o que é bom, mas devemos aprender, constantemente, a amar, a servir, a cuidar, a perdoar e a pedir ajuda, a ser bênção e luz uns para os outros. Como a Igreja, também tu e eu somos lunares, não temos luz própria, mas absorvemos a luz que vem do alto, que vem do Céu, que vem de Jesus, preenchendo-nos, e expandindo-se através de nós. Mais que um vidro, somos um cubo transparente inundado pela luz de Jesus, não para a retermos, mas para iluminarmos o espaço e o tempo.

Diz-nos Jesus: «Aprendei a parábola da figueira: quando os seus ramos ficam tenros e brotam as folhas, sabeis que o Verão está próximo. Assim também, quando virdes acontecer estas coisas, sabei que o Filho do homem está perto, está mesmo à porta. Em verdade vos digo: Não passará esta geração sem que tudo isto aconteça. Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão. Quanto a esse dia e a essa hora, ninguém os conhece: nem os Anjos do Céu, nem o Filho; só o Pai».

Gostávamos de conhecer o futuro e o que nos reserva de bom e de mau! E, de facto, o futuro é certo, é de Deus. Jesus está à porta! Abramos-Lhe o nosso coração e a nossa vida. Ele vem! A sua Palavra cumpre-se. É uma promessa. É uma certeza que Ele nos dá. As suas palavras não passarão. A salvação que nos traz da eternidade resgatar-nos-á à história e ao tempo. Não há abismos que possam separar-nos do amor de Deus. E porque não sabemos o dia nem a hora, resta-nos, e ainda bem, viver seguros que Deus caminha entre nós, connosco, e não nos faltará em nenhum momento, por mais tenebroso que seja.

4 – A profecia de Daniel, numa linguagem apocalíptica, revela-nos aquele tempo que está para chegar, num misto de angústia e de esperança. Angústia pelo que os nossos olhos veem, confiança colocando o olhar do nosso coração em Deus e no Seu amor paterno/materno.

“Surgirá Miguel, o grande chefe dos Anjos, que protege os filhos do teu povo. Será um tempo de angústia, como não terá havido até então, desde que existem nações”. A angústia parece inevitável! Estará a pairar sobre nós! Como ameaça? Inevitável? Porém, também Daniel contrapõe: “Mas nesse tempo, virá a salvação para o teu povo, para aqueles que estiverem inscritos no livro de Deus. Muitos dos que dormem no pó da terra acordarão, uns para a vida eterna, outros para a vergonha e o horror eterno. Os sábios resplandecerão como a luz do firmamento e os que tiverem ensinado a muitos o caminho da justiça brilharão como estrelas por toda a eternidade”.

Para resplandecermos de luz, diz-nos o profeta, comprometamo-nos com a sabedoria, ensinando o caminho da justiça a quantos se cruzarem connosco.

5 – Todavia, se a referência formos nós, as nossas capacidades e talentos, se nos tornarmos o centro, acabaremos por rodopiar sobre nós próprios, mas dificilmente caminharemos em segurança. Mais tarde ou mais cedo acabaremos por endeusar ou instrumentalizar alguém ou por nos desencantarmos da vida e das pessoas. Se tudo correr como expectável, ensoberbar-nos-emos, enchendo-nos de orgulho – somos os maiores! Se as coisas derem para o torto, culparemos os outros, as circunstâncias ou os astros que não se alinharam com o nosso empenho.

Pés bem assentes na terra, mas olhar levantado para Deus, de Quem nos vem a graça e a salvação, a luz, a bênção e inspiração. A oração há de tornar-se o combustível que nos faz repousar em Deus e por Ele orientar as nossas opções. “Senhor nosso Deus, concedei-nos a graça de encontrar sempre a alegria no vosso serviço, porque é uma felicidade duradoira e profunda ser fiel ao autor de todos os bens”.

Quem se apoia em si mesmo, como Pedro a caminhar sobre as águas, acaba por ir ao fundo. Porém, se olhar para cima e para a mão estendida do Senhor logo avançará seguro, apesar da borrasca. Sigamos o conselho de Santo Inácio de Loiola: «Age como se tudo dependesse de ti, mas consciente de que na realidade tudo depende de Deus». Desta forma libertamo-nos da ansiedade de querermos construir um mundo à nossa imagem para nos comprometermos a caminhar juntos, procurando, com os outros, construir um mundo de acordo com a vontade de Deus que vamos acolhendo e concretizando.

Com o salmista, coloquemos a nossa confiança em Deus. “Senhor, porção da minha herança e do meu cálice, está nas vossas mãos o meu destino. O Senhor está sempre na minha presença, com Ele a meu lado não vacilarei. Por isso o meu coração se alegra e a minha alma exulta e até o meu corpo descansa tranquilo. Vós não abandonareis a minha alma na mansão dos mortos, nem deixareis o vosso fiel sofrer a corrupção”.

6 – Com Jesus, chegamos à plenitude do tempo; vivemos, com Ele, nos últimos tempos. Na verdade, só temos mesmo este tempo. Há que aproveitar! Amanhã… é sempre tarde, porque só Deus sabe o tempo de que dispomos para viver, para amar, para servir!

Encarnando, Jesus faz com que o Céu descesse à terra; com a Sua ressurreição/ascensão, Jesus faz com que a terra, a humanidade, a nossa natureza humana, se fixe para sempre na eternidade de Deus, até que tudo Lhe seja submetido.

Ele é o Sumo Sacerdote que liga o Céu e a terra, não exteriormente, mas em Si mesmo, no Seu corpo, na Sua vida. “Todo o sacerdote da antiga aliança se apresenta cada dia para exercer o seu ministério e oferecer muitas vezes os mesmos sacrifícios, que nunca poderão perdoar os pecados. Cristo, ao contrário, tendo oferecido pelos pecados um único sacrifício, sentou-Se para sempre à direita de Deus, esperando desde então que os seus inimigos sejam postos como escabelo dos seus pés. Porque, com uma única oblação, tornou perfeitos para sempre os que Ele santifica. Onde há remissão dos pecados, já não há necessidade de oblação pelo pecado”.

Aquele dia há de chegar, mas quando isso acontecer, seremos conduzidos ao coração de Deus, para sempre, porquanto vivamos com alegria, com-fraternizando, reconhecendo-nos e tratando-nos como irmãos.

Pe. Manuel Gonçalves


Leituras para a Eucaristia (ano B): Dan 12, 1-3; Sl 15 (16); Hebr 10, 11-14. 18; Mc 13, 24-32.