DOMINGO XXXIII DO TEMPO COMUM – ano A – 15 de novembro de 2020

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DOMINGO XXXIII DO TEMPO COMUM – ano A – 15 de novembro de 2020

1 – Muitos alunos estudam, não tanto para aprenderem, mas para obter uma boa classificação. O ideal, como muitos defendem, é que o processo de ensino-aprendizagem não estivesse organizado em função de exames, mas potenciasse aprendizagens significativas de acordo com os gostos e motivações dos alunos, com um currículo que fosse tão abrangente quantos os alunos e respondesse às suas aspirações, expectativas, sonhos, projetos de vida, com uma orientação muito limitada! Porém, mesmo havendo projetos educativos diferenciados, a avaliação continua a fazer-se predominantemente por testes, frequências e exames. Ao longo dos anos tem-se insistido na avaliação contínua: avalia-se o esforço e a progressão, observa-se a postura, as intervenções, voluntários ou solicitadas, o trabalho realizado em contexto de sala de aula, mas, no final, o decisivo, continua a valer sobretudo o resultado das fichas de avaliação. No Ensino Superior, predomina abundantemente a avaliação final, com trabalhos e7ou exames.

Nestes últimos domingos do ano litúrgico, a Palavra de Deus fala-nos do final da história, da vida, do tempo, fala-nos na nossa morte e do encontro (definitivo) com Deus. Deus criou-nos por amor, por amor nos sustém na vida, por amor nos salva e nos abre, em Cristo, as portas da eternidade. Ele precede-nos e aguarda-nos para quando forem horas de passarmos desta vida para a vida eterna, a Sua morada, que passa a ser também a nossa habitação para sempre.

No entretanto, sem Se ausentar, alheado e distante, Deus confia-nos o mundo, dá-nos o tempo, gratuitamente, os dons e os talentos, para que cuidemos uns dos outros e para administrarmos os bens da criação. A perspetiva não é o açambarcamento, mas a partilha que multiplica o que se dá! D. António Couto, Bispo de Lamego, refere que o pecado dos primeiros pais não foi o comerem do fruto da árvore, mas o facto de o recolherem e o reterem só para si mesmos, sem deixar nada para outros.

O que Deus dá não é para esconder, para guardar, mas para dividir. O que guardamos perde-se, o que damos multiplica-se.

2 – Neste trigésimo terceiro Domingo do tempo comum, o Evangelho apresenta-nos mais uma parábola de Jesus sobre o Reino de Deus. Um homem, partindo de viagem, confia os seus bens aos seus servos, entregando cinco talentos a um, dois a outro e um a outro, segundo a capacidade de cada um.

Ao regressar, avalia o trabalho dos seus servos e pede-lhes por contas sobre o que fizeram com os talentos que lhes confiou. O primeiro multiplicou os cinco talentos, gerando outros cinco. E assim aquele a quem foram confiados dois talentos: apresentou outros dois! Então o senhor disse a cada um: “Muito bem, servo bom e fiel. Porque foste fiel em coisas pequenas, confiar-te-ei as grandes. Vem tomar parte na alegria do teu senhor”.

Por fim, apresentou-se o servo a quem tinha sido confiado um talento. Bem diferente dos outros, em vez do lucro apresenta desculpas e justificações, deixou que o medo o paralisasse, não arriscando absolutamente nada. “Senhor, eu sabia que és um homem severo, que colhes onde não semeaste e recolhes onde nada lançaste. Por isso, tive medo e escondi o teu talento na terra. Aqui tens o que te pertence”. Como sói dizer-se: desculpas de mau pagador!

A resposta do senhor é esclarecedora: “Servo mau e preguiçoso, sabias que ceifo onde não semeei e recolho onde nada lancei; devias, portanto, depositar no banco o meu dinheiro e eu teria, ao voltar, recebido com juro o que era meu”.

Através desta parábola, Jesus diz-nos que Deus confia em nós e por isso nos dá diferentes graças, dons e talentos. Da nossa parte, não esperemos pela última hora, não nos preocupemos com o “temperamento” do senhor, preocupemo-nos, sim, em fazer render os talentos que recebemos.

3 – O salmista fala do temor, que é diferente do medo. O medo paralisa-nos, o temor compromete-nos a agir. Tenho medo, logo, escondo-me, retraio-me, fico à espera (que o tempo passe, que os outros façam, que os problemas se resolvam por si mesmo). O temor leva-nos a agir, temos receio de magoar o outro, não é o medo do outro, mas o medo de o magoarmos pelo que dizemos ou fazemos, então procuramos ser agradáveis e corresponder, tanto quanto possível, à confiança em nós depositada.

“Feliz de ti que temes o Senhor e andas nos seus caminhos. Comerás do trabalho das tuas mãos, serás feliz e tudo te correrá bem. Tua esposa será como videira fecunda, no íntimo do teu lar; teus filhos serão como ramos de oliveira, ao redor da tua mesa. Assim será abençoado o homem que teme o Senhor. De Sião te abençoe o Senhor: vejas a prosperidade de Jerusalém todos os dias da tua vida”. Aquele que teme o Senhor, é o que ama o seu Senhor, e em tudo se deixa guiar pela sabedoria que lhe vem do alto, procurando ser justo seguindo a sua Lei, colocando-O em primeiro lugar e servindo-O nos irmãos.

A primeira leitura, curiosamente, fala na mulher que teme ao Senhor, a mulher virtuosa. “Quem poderá encontrar uma mulher virtuosa? O seu valor é maior que o das pérolas. Nela confia o coração do marido e jamais lhe falta coisa alguma… Abre as mãos ao pobre e estende os braços ao indigente… a mulher que teme o Senhor é que será louvada. Dai-lhe o fruto das suas mãos e suas obras a louvem às portas da cidade”.

4 – “Abre as mãos ao pobre e estende os braços ao indigente”. O temor desta mulher faz-se ver pelo cuidado que tem pelos mais pobres. Trata da casa, mas não descuida dos mais desfavorecidos.

Hoje, penúltimo domingo do ano litúrgico, a Igreja, convocada pelo Papa Francisco, celebra o 4.º Dia Mundial dos Pobres. «Estende a tua mão ao pobre» (Sir 7, 32), é o tema escolhido pelo Santo Padre para esta comemoração. Logo na introdução, o Papa diz o seguinte: “A pobreza assume sempre rostos diferentes, que exigem atenção a cada condição particular: em cada uma destas, podemos encontrar o Senhor Jesus, que revelou estar presente nos seus irmãos mais frágeis (cf. Mt 25, 40)”. A exaltação da mulher virtuosa é um desafio a que também nós abramos as nossas mãos aos pobres e respondamos aos irmãos mais frágeis.

E o Papa prossegue, dizendo que “são inseparáveis a oração a Deus e a solidariedade com os pobres e os enfermos. Para celebrar um culto agradável ao Senhor, é preciso reconhecer que toda a pessoa, mesmo a mais indigente e desprezada, traz gravada em si mesma a imagem de Deus. De tal consciência deriva o dom da bênção divina, atraída pela generosidade praticada para com os pobres. Por isso, o tempo que se deve dedicar à oração não pode tornar-se jamais um álibi para descuidar o próximo em dificuldade. É verdade o contrário: a bênção do Senhor desce sobre nós e a oração alcança o seu objetivo, quando são acompanhadas pelo serviço dos pobres”.

Não é possível desligar a fé, a prática religiosa, o temor a Deus, a bênção divina, a oração, da vivência das obras de misericórdia, do cuidado aos mais desfavorecidos, do serviço aos irmãos. Peçamos ao Senhor que venha em nosso auxílio nos medos, nas hesitações e nas dúvidas, nos cansaços e na indiferença às carências e aos sofrimentos alheios. “Senhor nosso Deus, concedei-nos a graça de encontrar sempre a alegria no vosso serviço, porque é uma felicidade duradoira e profunda ser fiel ao autor de todos os bens”. O serviço a Deus inclui, pressupõe e exige o serviço a todos os Seus filhos, especialmente os mais pequeninos.

5 – Ao longo dos últimos Domingos tem-nos sido servida como segunda leitura a missiva do Apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses, que aborda a questão da morte, da vida que precede o encontro definitivo com Deus, o julgamento final como ressurreição dos mortos, morrendo com Cristo e com Ele ressuscitando.

Existe uma grande dificuldade em falar de morte, dificultando o próprio luto, ainda que paralelamente se promova a cultura da morte em grande escala, descartando os mais frágeis, os que não têm forma de se defender. Afastamos as crianças, quando morre algum familiare, e mantemos, tanto quanto é possível, os cemitérios distantes das áreas habitadas.

Há pouco mais de um ano, o Papa, dirigindo-se a jovens, dizia claramente que começamos a morrer quando deixamos de falar e refletir sobre a morte, pois esta faz-nos tomar consciência dos nossos limites, na certeza que não estaremos cá para sempre e de que não somos, em definitivo, donos disto tudo, o que nos levará a apostar na vida que temos! Se sabemos que vamos morrer, então vivamos!

Diz-nos o Apóstolo: “Sobre o tempo e a ocasião, não precisais que vos escreva, pois vós próprios sabeis perfeitamente que o dia do Senhor vem como um ladrão noturno. Vós, irmãos, não andais nas trevas, de modo que esse dia vos surpreenda como um ladrão, porque todos vós sois filhos da luz e filhos do dia: nós não somos da noite nem das trevas. Por isso, não durmamos como os outros, mas permaneçamos vigilantes e sóbrios”.

A morte está certa! A hora é incerta! Não adiemos a vida, não deixemos para amanhã os minutos e as horas que podemos aproveitar e viver hoje! Mantenhamo-nos vigilantes, façamos render os talentos que Deus nos dá. O ontem pertence à memória, e é raiz; o amanhã, pertence a Deus, não sabemos se lá chegamos, e não se chega lá sem o “hoje”, o único que temos para viver.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A: Prov 31, 10-13. 19-20. 30-31; Sl 127 (128); 1 Tes 5, 1-6; Mt 25, 14-30.