Domingo III do Advento – ano C – 2021

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Domingo III do Advento – ano C – 2021

1 – “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. Seja de todos conhecida a vossa bondade. O Senhor está próximo. Não vos inquieteis com coisa alguma; mas em todas as circunstâncias, apresentai os vossos pedidos diante de Deus, com orações, súplicas e ações de graças. E a paz de Deus, que está acima de toda a inteligência, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus”.

 Belíssimo este pensamento do apóstolo São Paulo. Sobressai de imediato o desafio à alegria, que não é mero contentamento exterior, mas a paz e a confiança que brotam do coração do crente e do facto de se saber amado por Deus, salvo por Jesus Cristo. É simultaneamente um compromisso com a bondade. O apóstolo fala da segunda vinda de Jesus, mas partindo da primeira, encarnação, vida, missão, morte e ressurreição de Cristo Jesus. Estamos dentro de uma inclusão cristológica e salvífica, encontramo-nos na plenitude dos tempos.

A este propósito vale a pena recordar a reflexão do apóstolo, em diversas ocasiões, em que sublinha que a vinda de Jesus não está remetida (somente) para o fim dos tempos mas acontece agora, connosco, no tempo presente. Daí a importância da oração – que nos liga a Deus e n’Ele aos outros – e do bem que possamos fazer – expressão de uma fé autêntica –, procurando a configuração a Jesus Cristo, antecipando para a nossa vida a eternidade de Deus.

A alegria assenta na certeza que Deus atende às nossas súplicas, com prontidão em socorrer-nos em todos os momentos da nossa existência e lança-nos ao encontro daqueles que peregrinam ao nosso lado, pela história e pelo tempo fora.

2 – O terceiro domingo do Advento é precisamente conhecido como o Domingo da Alegria. Razões não faltam aos cristãos para viverem na ALEGRIA do Deus que vem e que permanece. Não estamos isentos de contratempos, de dificuldades, é algo de incontornável, faz parte da nossa fragilidade e finitude humanas. Não somos deuses, estamos a caminho e sujeitos às circunstâncias do tempo que corre, do mundo, das pessoas que nos rodeiam, da nossa identidade biológica e da nossa inserção social.

A alegria, como anteriormente ficou insinuado, vem de dentro, da nossa identidade – somos herdeiros/filhos de Deus –, da nossa pertença – irmãos em Jesus Cristo – e da salvação que Ele nos traz. Não somos prisioneiros nem do pecado nem da morte. Estamos configurados, pelo batismo, à morte e ressurreição de Jesus Cristo. Ele veio, Ele vem, Ele virá, para a todos elevar para Deus, para todos salvar, não no fim mas a partir da Cruz e para sempre.

Nesta tensão, entre a celebração festiva do Natal, que nos coloca no presépio junto a Deus que Se faz criança, e a vinda definitiva de Jesus, no dia-a-dia, e no final, quando Deus fizer regressar a Si toda a criação, saboreamos já a salvação de Deus.

A profecia de Sofonias faz um apelo semelhante ao de São Paulo: «Clama jubilosamente, filha de Sião; solta brados de alegria, Israel. Exulta, rejubila de todo o coração, filha de Jerusalém. O Senhor revogou a sentença que te condenava, afastou os teus inimigos. O Senhor, Rei de Israel, está no meio de ti e já não temerás nenhum mal. Naquele dia, dir-se-á a Jerusalém: «Não temas, Sião, não desfaleçam as tuas mãos. O Senhor teu Deus está no meio de ti, como poderoso salvador. Por causa de ti, Ele enche-Se de júbilo, renova-te com o seu amor, exulta de alegria por tua causa, como nos dias de festa».

        O que Sofonias profetiza para o futuro, São Paulo vive-o como experiência, testemunhando a presença constante de Jesus na sua vida e na via das comunidades cristãs.

3 – Nestes ou noutros tempos, a alegria dos cristãos não significa a resignação com as situações do mal, pelo contrário, a alegria manifesta a certeza que o bem vencerá, Deus terá a última palavra. Nem a espada, nem a perseguição, nem a vida, nem a morte, prevalecerão à força do amor que nos vem de Deus. Esta certeza inunda o nosso coração de alegria, renova as nossas energias, compromete-nos com a justiça, com a paz, com a harmonia, com a construção da casa da Fé e do Evangelho, casa de todos e para todos.

Sem a fé, sem a certeza da salvação, muitos dos projetos não fariam sentido, far-nos-iam morrer na desilusão, na incerteza permanente, na resignação perante o mal. Se existe o mal e não há forma de o vencer não adianta o compromisso, o esforço, a luta. Se Ele vence o mundo, isto é, as forças do mal, então também nós podemos, com Ele, com a Sua graça, contribuir para vencer o a injustiça, o medo, o egoísmo, a intolerância e todas as manifestações malévolas.

O anúncio de João Batista traz a iminência do Messias, a alegria por O sabermos próximo, mas igualmente o envolvimento com o bem e com a verdade. As pessoas percebem que o anúncio de João leva a mudar de vida. João responde em concreto: «quem tiver duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma; e quem tiver mantimentos faça o mesmo»; aos publicanos diz «não exijais nada além do que vos foi prescrito»; aos soldados, «não pratiqueis violência com ninguém nem denuncieis injustamente; e contentai-vos com o vosso soldo».

4 – Estamos a poucos dias do Natal, expressão da Encarnação, Deus que Se faz homem, assumindo a nossa humanidade. O Advento convoca-nos a entrar no presépio com Maria e com José, para acolhermos Jesus que está mesmo a chegar. Aí residirá a nossa alegria, a nossa esperança e que se multiplicará em caridade. A fé reveste-se de esperança, de alegria, funda-se em Deus que é Pai e nos ama com amor e coração de Mãe. Não é uma fé aérea, algo vago, efémero, mas assenta na omnipotência e misericórdia do Senhor Deus. Sendo Deus e sendo Pai responsabiliza-nos uns pelos outros, pois n’Ele somos irmãos. É essa a revelação de Jesus. A fé não nos desliga, não nos afasta, não faz de nós melhores que outros, em sentido de sobranceria, dá-nos a responsabilidade de sermos santos. É fé é para manusear, para colocar mãos à obra, a fé conduz-nos, fortalece-se e madurece na prática da caridade.

Os contemporâneos de João Batista alegram-se com o anúncio da vinda do Messias. Querem estar preparados. João anuncia-lhes a Boa Nova, mas esclarece: «Eu batizo-vos com água, mas está a chegar quem é mais forte do que eu, e eu não sou digno de desatar as correias das suas sandálias. Ele batizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo. Tem na mão a pá para limpar a sua eira e recolherá o trigo no seu celeiro; a palha, porém, queimá-la-á num fogo que não se apaga».

Deixemo-nos contagiar pelas suas palavras e com Isaías rezemos: “Cantai ao Senhor, porque Ele fez maravilhas, anunciai-as em toda a terra. Entoai cânticos de alegria, habitantes de Sião, porque é grande no meio de vós o Santo de Israel”.

A oração predispõe-nos a acolher a vontade de Deus e a fazermos o que nos compete para realizar a Sua santa vontade. A alegria que transborda em nós é comunicável e partilhável. Uma pessoa triste e melancólica tende a afastar-se, a isolar-se, a dobrar-se sobre si própria. Uma pessoa alegre, confiante, convicta das suas raízes e consciente da meta para onde se dirige, contagia os outros, trasvaza nas palavras e nos gestos, torna-se generosa. Uma alegria tão grande, fundada em Deus, faz com que nem as adversidades sejam obstáculo para viver. Pelo contrário, se sabemos Deus connosco, então caminhamos seguros e saberemos que nada nos poderá separar desse amor e dessa vida.

Pe. Manuel Gonçalves


Leituras para a Eucaristia (ano C): Sof 3, 14-18a; Salmo: Is 12,2-3.4bcd.5-6; Filip 4, 4-7; Lc 3, 10-18.