Domingo II do Tempo Comum – ano A – 2023

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Domingo II do Tempo Comum – ano A – 2023

1 – «Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo. É d’Ele que eu dizia: ‘Depois de mim vem um homem, que passou à minha frente, porque era antes de mim’. Eu não O conhecia, mas foi para Ele Se manifestar a Israel que eu vim batizar na água».

Depois do Advento e do Natal, entrámos no Tempo Comum, num itinerário que nos levará até à Quaresma e que retomaremos depois do Tempo de Páscoa, que culmina no Pentecostes, conduzindo-nos, então, até à solenidade de Cristo Rei. A Festa do Batismo, ocorrida este ano na passada segunda-feira, 9 de janeiro, é como que um preâmbulo a este caminho litúrgico e espiritual. O Evangelho faz-nos ver João Batista a apontar para Jesus e para a missão que Ele encarna.

Se dúvidas houvesse, João Batista insiste nos indícios, ou nas provas, relevando o que Deus previamente lhe havia anunciado: «Eu vi o Espírito Santo descer do Céu como uma pomba e permanecer sobre Ele. Eu não O conhecia, mas quem me enviou a batizar na água é que me disse: ‘Aquele sobre quem vires o Espírito Santo descer e permanecer é que batiza no Espírito Santo’. Ora, eu vi e dou testemunho de que Ele é o Filho de Deus».

Esta é uma interpelação para nós como cristãos, se também O vimos, na nossa vida pessoal, familiar, comunitária, e nos acontecimentos do mundo, só podemos dar testemunho que Ele é o Filho de Deus que enche e preenche a nossa vida e que veio como Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Ontem, física e temporalmente, hoje através do Seu Espírito Santo e através do nosso viver, expresso em palavras e obras.

2 – Na segunda leitura, o Apóstolo da Palavra, saúda-nos em forma de oração e de compromisso com o Evangelho: «Paulo, por vontade de Deus escolhido para Apóstolo de Cristo Jesus e o irmão Sóstenes, à Igreja de Deus que está em Corinto, aos que foram santificados em Cristo Jesus, chamados à santidade, com todos os que invocam, em qualquer lugar, o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso: A graça e a paz de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo estejam convosco».

É uma das saudações que a Liturgia assumiu e que nos envolve, desde a começo da celebração eucarística, no mistério pascal, na vida divina. Com efeito, não esqueçamos, fomos santificados e somos chamados à santidade, a acolher e realizar a vida de Deus em nós, como batizados, imersos na água e enxertados em Cristo, pelo Seu santo Espírito.

3 – O profeta Isaías, por sua vez, na primeira leitura que nos é servida, apresenta a eleição e a missão do Servo do Senhor, que, facilmente, identificamos com Jesus Cristo, o Filho de Deus e que, no tempo e na história, nos assume como irmãos, revelando-nos a filiação divina. Somos filhos amados de Deus em Jesus, Seu filho primogénito, e, porque somos filhos, também somos, entre nós, irmãos.

Deus escolhe-nos, cria-nos por amor, chama-nos à existência. Parafraseando Bento XVI, desde sempre estamos nos pensamentos de Deus. «Ele que me formou desde o seio materno, para fazer de mim o seu servo, a fim de Lhe reconduzir Jacob e reunir Israel junto d’Ele. Eu tenho merecimento aos olhos do Senhor e Deus é a minha força».

Não somos ilhas isoladas. A nossa vida só tem sentido, um sentido de liberdade, de amor e de plenitude, se incluir os outros. Pertencemo-nos, pois a nossa origem é comum, somos de Deus. Se Ele é Deus e Pai de todos, a Sua alegria e a Sua glória manifestam-se e concretizam-nos na harmonia da humanidade, na realização perfeita, tanto quanto nos é possível, da fraternidade humana. A eleição e o chamamento, o Servo do Senhor, identificável com o Povo de Israel, identificável com os eleitos/enviados por Deus, encarnado em plenitude em Jesus, é uma eleição “instrumental”, visa fazer chegar a todos a luz e o amor de Deus.

«Tu és o meu servo, Israel, por quem manifestarei a minha glória… Não basta que sejas meu servo, para restaurares as tribos de Jacob e reconduzires os sobreviventes de Israel. Vou fazer de ti a luz das nações, para que a minha salvação chegue até aos confins da terra».

Na apresentação de Jesus no Templo, o velho Simeão identifica e testemunha que Aquele Menino, filho de Maria e de José, é a glória de Israel, é a Luz para se revelar às nações.

4 – O culto hebreu, como muitos outros, previa o oferecimento de animais. Conforme as possibilidades das famílias, assim as oferendas. O cordeiro pascal, depois da libertação do Egipto, e da travessia do deserto, é uma oferenda a Deus, mas igualmente, momento de partilha, de fazer memória pelas maravilhas divinas, num convite a avivar os acontecimentos, comunicando-os aos mais novos. Com efeito, todas as famílias comerão o cordeiro pascal. Quem não tiver essa possibilidade própria, a solidariedade vizinha permiti-lo-á.

Já antes, o cordeiro era oferecido para remissão dos pecados, e para a salvação, como aquando das pragas do Egipto, o sangue do cordeiro, ungido nas umbreiras das portas dos hebreus, avisava o Anjo da morte para passar adiante. Ou o cordeiro que Deus faz aparecer para substituir o filho de Abraão na sua oferenda a Deus. Com Jesus, não há mais lugar ao sacrifício animal, Ele oferece-Se como cordeiro sem mancha, uma vez para sempre e por todos, como homem e como Deus. Aqui não há cordeiro que substitua o Filho, é o Filho que Se apresenta e Se oferece a Deus, como expressão do amor total e pleno. Ele assume as nossas dores, os nossos pecados, a nossa morte, para que, em definitivo, sejamos libertos de todo o sofrimento, de toda a treva e de todo o mal. O caminho que nos liberta é o do amor e da ternura.

O salmista clarifica a vontade de Deus: «Não Vos agradaram sacrifícios nem oblações, mas abristes-me os ouvidos; não pedistes holocaustos nem expiações, então clamei: «Aqui estou». / «De mim está escrito no livro da Lei que faça a vossa vontade. Assim o quero, ó meu Deus, a vossa lei está no meu coração». / Proclamei a justiça na grande assembleia, não fechei os meus lábios, Senhor, bem o sabeis. Não escondi a vossa justiça no fundo do coração, proclamei a vossa fidelidade e salvação».

Não são os sacrifícios que importam, o decisivo é o louvor, a prática da justiça e do bem, a vivência dos desígnios de Deus. Deus não Se compraz com os nossos sofrimentos, com o nosso sacrifício, ainda que, em momentos, possa ser inevitável, pelo esforço, dedicação e empenho que colocamos no nosso compromisso com a verdade e com a justiça. A vontade de Deus é a vida, a alegria e a felicidade do homem, é que o pecador se converta, é que a vida seja sabor e bênção. Nos momentos de treva, Deus apresenta-Se como Luz; nos momentos de tormenta, Deus aconchega-nos no Seu colo; nos momentos de luta, Deus conta comigo e contigo para tornarmos o mundo mais habitável, para todos.

5 – «Deus todo-poderoso e eterno, que governais o céu e a terra, escutai misericordiosamente as súplicas do vosso povo e concedei a paz aos nossos dias».

Rezemos, comprometendo-nos uns com os outros, na família, no trabalho, na sociedade, façamos o que está ao nosso alcance para valorizarmos, testemunharmos e efetivarmos o amor de Deus no tempo que nos é dado viver e no mundo que é a nossa casa. Ainda que esta não seja a nossa morada permanente e definitiva, cabe-nos cuidar para usufruirmos e para que outros usufruam desta casa que Deus nos dá até que tenhamos a definitiva na Sua eternidade.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Is 49, 3. 5-6; Sl 39 (40); 1Cor 1, 1-3; Jo 1, 29-34.