Domingo XV do tempo Comum – B – 2021

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Domingo XV do tempo Comum – B – 2021

1 – Jesus é o Enviado que envia, que nos envia. Nós somos Seus discípulos. Sempre. Em toda a parte e em todos os momentos. Não há cristãos que não sejam discípulos e não há discípulos de Jesus que não sejam apóstolos, missionários, isto é, enviados por Ele. Anunciamos o Reino de Deus presente em Jesus, na humanidade e na história do mundo.

Os apóstolos ainda terão muito que aprender, muito sal para comer, muito caminho para percorrer, mas, entretanto, Jesus envolve-os, dá-lhes responsabilidades, treina-os para os dias que hão vir e em que já não estará fisicamente no meio deles.

Não vão sozinhos. Uma pessoa sozinha tende a perder-se, porque se deslumbra e perde o foco, esquece a mensagem e a missão, ou porque se desencanta e deprime, desiludido. Dois é um bom começo para a comunidade, para o diálogo, para a entreajuda e confiança. Um lembra ao outro a missão e a mensagem e mutuamente relativizam o sucesso ou mutuamente se animam. Mas mais importante ainda, é que não esqueçam a mensagem que têm entre mãos e Quem verdadeiramente é o conteúdo do anúncio, Jesus Cristo.

Sem a comunidade não há cristãos, mesmo que a alguns dê jeito pensar e dizer desse modo, como não é possível sermos filhos do mesmo Pai sem nos reconhecermos irmãos.

2 – Se vais não leves muita coisa. Se vou, terei que renunciar a tudo o que me pesa no caminho. Não leveis nada para o caminho, a não ser um bastão para apoiar os vossos passos quando estiverdes cansados e para vos lembrardes qual o cajado que vos sustenta. Ide, com agilidade e leveza, levai apenas uma túnica e os pés calçados com sandálias. Calçado simples, mas confortável, evitando sacrifícios inúteis que só atrasariam a jornada. É que a missão não vale pelos sacrifícios, por mais meritórios que sejam, vale pelo próprio anúncio do Reino de Deus, porquanto coloca disponíveis e visíveis os benefícios da salvação divina. É como a Cruz que vale, não tanto pelo sofrimento que envolve, mas como expressão do amor de Deus por nós, levado até ao fim.

Mais importante que as coisas a levar, é a mensagem a comunicar. Quem vai de férias ou de viagem tende a levar muita coisa, para ter tudo à mão, mas, muitas vezes, perde-se mais tempo a preparar as coisas, a cuidar para que não se percam, a assegurar o seu acondicionamento e transporte, que os momentos de repouso. Cingindo-nos ao essencial, poderemos dispor melhor do tempo, mesmo que fique alguma coisa em casa.

Há muitas coisas que nos pesam, que nos afastam dos outros, que nos impedem de ver os outros como irmãos, que dificultam o diálogo e a disponibilidade para a escuta. Se tens muitos sacos, não consegues dar um abraço em condições. Se tens o saco cheio de preconceitos, não consegues amar, não consegues transparecer a alegria da paz e da ternura.

Com a mensagem, Jesus dá-lhes, dá-nos, o poder de curar os enfermos e expulsar os demónios.

3 – Deus conta comigo e contigo, com os doze, com dois ou três, ou cinquenta. Se estamos em Seu nome, poucos ou muitos, Ele está no meio de nós e o Seu Reino prospera.

Outras recomendações de Jesus: «Quando entrardes em alguma casa, ficai nela até partirdes dali. E se não fordes recebidos em alguma localidade, se os habitantes não vos ouvirem, ao sair de lá, sacudi o pó dos vossos pés como testemunho contra eles».

É Jesus que nos envia. É d’Ele o mandato. A mensagem a proclamar – a proximidade do reino, o arrependimento e a fé no Evangelho (cf. Mc 1, 14-15) – é de Cristo. O risco dos discípulos é quererem ser mestres, desligando-se do verdadeiro Mestre, de Jesus Cristo, e, em vez de anunciarem o Evangelho, anunciarem-se a si mesmos. É também este o perigo da Igreja – constituída por todos os discípulos de Jesus –, de se debruçar sobre si mesma, protegendo-se, protegendo os privilégios que adquiriu. Desde o início do seu pontificado, o Pap Francisco tem-se referido à doença de uma Igreja ensimesmada, autorreferencial, voltada para o interior onde já só se encontra uma ovelha. Ao invés, a Igreja deve sair, à procura das 99 ovelhas que se tresmalharam, e anunciar Jesus. Não esquecer, nunca, a dimensão lunar da Igreja e dos cristãos que a compõem. A Lua reflete a luz do Sol, assim a Igreja e os cristãos, para haver autenticidade, anunciam Jesus, caminho, verdade e vida.

“Os Apóstolos partiram e pregaram o arrependimento, expulsaram muitos demónios, ungiram com óleo muitos doentes e curaram-nos”. No regresso, contam a Jesus o que anunciaram e fizeram e como através deles atuou o Espírito de Deus.

4 – Há oito dias, Ezequiel, São Paulo e Jesus experimentavam a adversidade da missão. Os textos diziam-nos que eles, imbuídos do Espírito Santo, anunciavam Deus em todas as circunstâncias, sujeitando-se a ser recusados e até agredidos, perseguidos ou mortos. Ezequiel não recua, pois cumpre o mandato de Deus. Podem não o escutar, mas ficam a saber que há um profeta no meio deles. Paulo não teme, pois, a consciência “obriga-o” a proclamar a Boa Nova da Salvação, Cristo crucificado e ressuscitado. Jesus vai à sua terra e perscruta a murmuração, a desconfiança e a suspeita, mas não deixa de desafiar o Seus conterrâneos.

Hoje é Amós que está sob ameaça dos poderosos, das pessoas bem instalados na vida pública, política e religiosa. O profeta tem consciência da sua vocação, da sua missão, e não vacila diante das falsas simpatias. O sacerdote do Templo avisa-o: «Vai-te daqui, vidente. Foge para a terra de Judá. Aí ganharás o pão com as tuas profecias. Mas não continues a profetizar aqui em Betel, que é o santuário real, o templo do reino».

Porém, a consciência de Amós diz-lhe algo bem diferente: «Eu não era profeta, nem filho de profeta. Era pastor de gado e cultivava sicómoros. Foi o Senhor que me tirou da guarda do rebanho e me disse: ‘Vai profetizar ao meu povo de Israel’».

Mais à frente veremos como também os Apóstolos se confrontarão com a adversidade, com a perseguição, com as insinuações, com a prisão e com a morte, mas manter-se-ão firmes e certos de que também nesses momentos Deus Se manifestará. Quem perseverar será salvo.

5 – Na segunda leitura, São Paulo, louva o Senhor Deus por Se compadecer de nós e nos dar a Sua bênção. São letras que evocam, de forma orante, as maravilhas que Deus opera, em plenitude, através de Jesus.

“Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que do alto dos Céus nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. N’Ele nos escolheu, antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, em caridade, na sua presença… N’Ele, pelo seu sangue, temos a redenção e a remissão dos pecados. Segundo a riqueza da sua graça, que Ele nos concedeu em abundância, com plena sabedoria e inteligência, deu-nos a conhecer o mistério da sua vontade”.

O sonho de Deus é instaurar todas as coisas em Cristo. N’Ele “fomos constituídos herdeiros… Foi n’Ele que vós também, depois de ouvirdes a palavra da verdade, o Evangelho da vossa salvação, abraçastes a fé e fostes marcados pelo Espírito Santo. E o Espírito Santo prometido é o penhor da nossa herança, para a redenção do povo que Deus adquiriu para louvor da sua glória”.

O mistério pascal reconcilia-nos uns com os outros e com Deus, destruindo dúvidas, divisões e inimizades. Deus, em Cristo, resgata-nos para os Seus desígnios de amor, de harmonia e de paz.

6 – O que experimentam os Apóstolos, o que sente Amós, o que vive São Paulo, o que é visível e pleno em Jesus Cristo, também nós o pedimos em oração, pois dessa forma amadurecemos a nossa fé e deixar-nos-emos maravilhar pela presença de Deus na história. Estaremos mais disponíveis e mais entusiasmados para testemunhar a nossa pertença ao Senhor da Vida.

Começamos a Eucaristia, com a oração (de coleta) que recolhe as nossas intenções e propósitos e nos compromete com o que pedimos: “Senhor nosso Deus, que mostrais aos errantes a luz da vossa verdade para poderem voltar ao bom caminho, concedei a quantos se declaram cristãos que, rejeitando tudo o que é indigno deste nome, sigam fielmente as exigências da sua fé”.

Como se pode ver, a alegria da fé não anula as exigências da mesma e as dificuldades no caminho. Será como os doentes que vão ao médico e têm de se submeter a exames, medicação, intervenções cirúrgicas… sofrem e sabem que têm um caminho longo pela frente, mas a esperança de que é por bem, que é para ficarem melhores, dá alento para continuar.

Com o salmista, em dinâmica orante, suplicamos e reconhecemos os benefícios de Deus a nosso favor. “Mostrai-nos, Senhor, o vosso amor e dai-nos a vossa salvação. / Deus fala de paz ao seu povo e aos seus fiéis e a quantos de coração a Ele se convertem. A sua salvação está perto dos que O temem e a sua glória habitará na nossa terra. / Encontraram-se a misericórdia e a fidelidade, abraçaram-se a paz e a justiça. A fidelidade vai germinar da terra e a justiça descerá do Céu. / O Senhor dará ainda o que é bom, e a nossa terra produzirá os seus frutos. A justiça caminhará à sua frente e a paz seguirá os seus passos”.

Na oração, no anúncio do Evangelho, nos nossos afazeres e compromissos, saibamos descansar em Jesus Cristo, contar-Lhe o que fazemos, o que nos (pre)ocupa, o que nos aproxima dos outros ou dificulta o nosso relacionamento com eles. Peçamos que nos dê o Seu Espírito para compreendermos as nossas fragilidades e a dos outros, aceitarmos o que não podemos mudar, e o ânimo para persistirmos nas adversidades, para que em tudo o que fizermos, em palavras e obras, seja para louvor e glória de Deus.

Pe. Manuel Gonçalves


Leituras para a Eucaristia (ano B): Amós 7, 12-15; Sl 84 (85); Ef 1, 3-14; Mc 6, 7-13.